“Abraham Lincoln: Caçador de Vampiros” faz estranha mistura de história e fantasia

“Abraham Lincoln: Caçador de Vampiros” faz estranha mistura de história e fantasia

O 16.° presidente americano é uma figura mítica para seus compatriotas. Bastante alto, considerado um boxeador experiente, acostumado a trabalhos manuais e, ainda assim, um advogado talentoso, além de ter guiado os EUA pela guerra civil, garantindo a libertação da maior parte dos escravos. Por conta disso é que faz bastante sentido para um estadunidense um livro e filme chamado “Abraham Lincoln: Caçador de Vampiros”. Mais sentido do que jamais fará um “Lula, Contra o Saci-Pererê” para qualquer brasileiro.

A ideia original veio de Seth Grahame-Smith, o mesmo que já tinha escrito “Orgulho, Preconceito e Zumbis”, que acabou responsável por transformar o próprio livro em roteiro. A brincadeira é reimaginar Abraham Lincoln, papel de Benjamin Walker, como tendo uma vida dupla, em segredo se dedicando ao nobre ofício de livrar o mundo de demônios chupadores de sangue.

O trauma começou já na infância, quando testemunhou sua mãe sendo morta por um vampiro, o que leva à ruína de seu pai. Anos mais tarde, ele busca sua vingança, mas só não acaba morto pela interferência de Henry, papel de Dominic Cooper, que resolve se tornar o mentor de Lincoln, o treinando. A maior parte do filme se desenvolve com Lincoln liquidando as missões passadas por Henry, balanceando sua vida com a ingressão na política, área que pensa ser mais efetiva para o combate dos vampiros, já que estes se alimentam majoritariamente de negros escravos (o que justifica grande parte do discurso social).

No papel o filme funciona melhor do que na tela. Por mais que o elenco se esforce, e tem gente talentosa entre eles, não há muito com o que trabalhar em relação aos personagens. Mary Todd Lincoln, papel de Mary Elizabeth Winstead, por exemplo, está mais em função decorativa que narrativa, entrando e saindo de cena aleatoriamente. O mesmo se pode dizer de Will, personagem de Anthony Mackie, amigo de infância de Lincoln, ou de Speed, papel de Jimmi Simpson, como o primeiro empregador do presidente.

O problema, talvez, tenha origem na ambição da história, que tenta abraçar toda a vida de Lincoln, ao mesmo tempo em que se presta a reapresentá-lo sob um ponto de vista novo e mítico. Isso tudo em uma hora e 40 minutos. Seria preciso um elenco, roteirista e diretor sensivelmente melhores para esse feito. Mas é difícil pensar que essa equipe tão boa assim toparia esse filme (até porque, uma equipe assim tão boa já está trabalhando em uma biografia séria de Lincoln, sob a batuta de Steven Spileberg).

Não que o filme não tenha seus méritos. As cenas de ação são particularmente boas, desde a clássica e inevitável sequência do treinamento, até o confronto final com o grande rei dos vampiros, Adam, papel de Rufus Sewell, repetindo seus trejeitos de vilão costumeiros. Além dessa, sobre um trem em movimento, e de uma perseguição ao pôr do sol, no meio de uma tropa de cavalos em disparada, são dois dos pontos altos do filme.

Mas a excelência das cenas de ação são o mínimo que se espera do cinema de Timur Bekmambetov, responsável pelo sucesso de “O Procurado”. Desde “Os Guardiões da Noite”, seu longa que o tirou da Rússia para Hollywood, já ficava claro sua mão boa para a ação. De resto, tudo o que a direção de Bekmambetov acrescenta é o fato dele, um russo, dirigir um filme sobre um dos mais queridos presidentes americanos. Sinal que a guerra fria já é um passado mais do que distante.

Publicado originalmente no Portal POP.

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Luiz Gustavo Vilela

Luiz Gustavo Vilela é jornalista formado pela PUC-Minas, especialista em Comunicação e Cultura pela UTFPR, mestre e doutorando em Comunicação e Linguagens pela UTP. Entre 2011 e 2015 foi crítico de cinema no Portal POP.

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