Animação “Turbo” não se arrisca e acaba esquecível

Há um esquema de roteiro que usa o modelo do herói improvável. Como todo esquema de roteiro, hoje em dia ele já nem mais pode ser chamado de clichê. Está além. Já é algo que está ligado em nossa cultura de modo que sabemos que, de tempos em tempos, um novo filme vai reaparecer com esse formato narrativo.

Eventualmente, os filmes que trazem o modelo de volta são bem inventivos, como “Vida de Inseto”, “FormiguinhaZ” ou “Ratatouille”. Às vezes não. “Turbo” está no segundo caso. Claro que as crianças, quando forem ver, ainda podem se surpreender e, de verdade, devem se divertir à valer. Especialmente por conta das cores vibrantes e cenas de ação alucinantes – uma pista de corrida do ponto de vista de um caracol é algo bem interessante visualmente -, mas muito também por causa dos personagens que, se não são exatamente carismáticos, são simpáticos ao menos. Já o adulto que for assistir ao filme já foi melhor tratado em outras animações.

“Turbo” é a história de um jovem mitômano. Teo é um caracol de jardim que é louco por velocidade e sonha em um dia ser rápido a ponto de um dia poder competir na Fórmula Indy, enquanto assiste programas de tv sobre ela. O delírio é tanto que pede para ser chamado de Turbo. Herói mais improvável possível, já que caracóis de jardim são das criaturas mais lentas do nosso planeta. E, por um desses mistérios da vida, Turbo acaba se tornando bem rápido em um acidente bizarro. Por conta de uma série outros acidentes que não vêm ao caso agora, ele e seu irmão, Chet, acabam nas mãos de Tito, um latino, dono de um carrinho de tacos, que vê nisso tudo uma chance de melhorar sua vida.

Turbo e Tito são dois sonhadores. E ambos têm seus irmãos – Angelo, no caso de Tito – para ficarem lhes lembrando que a vida acontece no mundo real. Que não dá para ficar acreditando em esquemas mirabolantes ou em soluções mágicas. E, no fim, a mensagem é que Tito e Angelo são os errados. Que esperança e força de vontade são tudo o que você precisa para vencer na vida e toda aquela coisa do sonho americano. E qualquer um que já tenha assistido sua meia dúzia de filmes na vida já sabe o tipo de final catártico que te espera quando esse tipo de mensagem é jogado na tela.

Como é uma animação contemporânea, ele é construído de forma que a mensagem fique diluída em meio a uma série de pequenas piadas e gags visuais. É aí que entram em cena toda uma miríade de coadjuvantes que são tão esquecíveis quanto mal desenvolvidos, mas que servem bem a seu propósito cômico. Nesta conta entram outros caracóis de jardim, os caracóis de corrida e os outros que dividem a área comercial com Tito e Angelo. Mas não se surpreenda se você, quando sair do cinema, tiver dificuldade de se lembrar quem é quem.

Se você procurar pela palavra “turbo” no Google Imagens, vai notar uma certa semelhança entre o formato da concha de um caracol de jardim e da peça responsável pelo turbo nos carros. Se tiver vindo daí a inspiração para o filme, do contraste que há em relação a duas coisas com mesmo formato e `espíritos` completamente diferentes, é preciso admitir que é bem criativo. Pena ter sido desenvolvido com tanta preguiça.

Publicado originalmente no Portal POP.

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Luiz Gustavo Vilela

Luiz Gustavo Vilela é jornalista formado pela PUC-Minas, especialista em Comunicação e Cultura pela UTFPR, mestre e doutorando em Comunicação e Linguagens pela UTP. Entre 2011 e 2015 foi crítico de cinema no Portal POP.

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