Boyhood: Da Infância à Juventude

Ellar Coltrane em Boyhood: Da Infância à Juventude

O desafio de Richard Linklater, diretor e roteirista de Boyhood: Da Infância à Juventude, não foi nada menos do que hercúleo. Por mais de uma década ele separou algumas semanas para, uma vez por ano, filmar uma parte da história de Mason (Ellar Coltrane), sua família e amigos. O resultado é uma espécie de épico doméstico americano, com foco nessas pessoas do Texas, que se desdobra sobre si mesma ao longo de 12 anos.

Como entrega o desnecessário subtítulo nacional, acompanhamos Mason da tenra infância ao fim da juventude, na faculdade, o correspondente aos seus anos de formação. Mas o importante não é o desfecho, e sim sua reação à separação dos pais, aos casamentos da mãe – e seus dois respectivos maridos com seus problemas particulares -, à descoberta da sexualidade, às mudanças de casa, aos valentões da escola e assim por diante.

Por isso não dá para pensar em Boyhood como um filme convencional, no sentido em que não há apresentação, conflito, clímax e resolução (em uma simplificação rasteira). O filme é um processo lento e gradual em que a personalidade de Mason se desenvolve. Não há, porém, personagens simplórios. Todos os que aparecem no filme são tratados de forma profunda, por mais rápido que seja seu tempo de cena. Com destaque para quem está mais perto do núcleo central, como seus pais e sua irmã (Patricia Arquette, Ethan Hawke e Lorelei Linklater).

Acompanhar Mason envelhecer nos dá a noção exata do que significa amadurecer em seu sentido mais profundo. Por que os problemas que temos aos 12 anos refletem muito pouco aos 13, menos ainda aos 14 e praticamente inexistem aos 20. Amadurecer, postula o filme enquanto acompanha as espinhas e o cabelo esquisito de Mason, é compreender que o tempo passa. E nada melhor do que cinema, a arte do tempo por excelência, para conseguir demonstrar isso.

É aí que o “método” de Linklater se sobressai. O efeito de filmar aos poucos, ao longo de tantos anos, com os mesmos atores – lembrando em parte sua trilogia “Antes do…”, em que a distância temporal entre os filmes é a mesma para os personagens – é muito mais impactante do que lançar mão de diferentes pessoas e maquiagem. O que traz, também, um desafio de roteiro imenso, já que é preciso atualizar o material constantemente, sem desconsiderar o que já foi filmado (não dava para voltar e refazer, afinal).

Linklater não apenas reconhece isso, como incorpora os acontecimentos desses anos na narrativa. Estão lá as guerras contra o Afeganistão e o Iraque, a reeleição de George W. Bush, bem como sua substituição por Barack Obama. Tudo se confunde com o amadurecimento de Mason no mesmo sentido em que funciona como uma inscrição no tempo, no sentido mais profundo e particular que envolve sua condição primária: ele passa.

Sobre o autor Veja todos os posts

Luiz Gustavo Vilela

Luiz Gustavo Vilela é jornalista formado pela PUC-Minas, especialista em Comunicação e Cultura pela UTFPR, mestre e doutorando em Comunicação e Linguagens pela UTP. Entre 2011 e 2015 foi crítico de cinema no Portal POP.

Leave a Reply

Your email address will not be published. Required fields are marked *