Caminhos da Floresta

Como é controlada por contadores e executivos que pouco entendem ou sequer gostam de cinema, uma das características mais básicas de Hollywood é a predação. Se algo faz sucesso em uma mídia, o investimento e o retorno são mais seguros do que apostar em uma ideia nova. Daí que a fórmula de sucesso na Broadway, com temática de fantasia, de Caminhos da Floresta pareceu certeira. Mas Rob Marshall não consegue se afastar o suficiente da versão para os palcos e criar algo que se sustente enquanto filme.

O musical criado por James Lapine e Stephen Sondheim para os palcos propõe unir dois elementos centrais de muitas das fábulas clássicas: a floresta e a hereditariedade. Assim, já no número de abertura, os personagens são compelidos a uma jornada por meio do desconhecido para corrigir ou perpetuar o destino que foi traçado por seus pais. Por isso a história é amarrada pelo padeiro e sua mulher (James Corden e Emily Blunt), que não podem ter filhos por conta de uma maldição lançada quando a mãe dele estava grávida. A bruxa (Meryl Streep), responsável pelo encanto, também foi amaldiçoada por sua mãe e coloca os dois em uma busca para desfazer ambos feitiços. É aí que se cruzam os caminhos com as outras fábulas, todas em situação análoga.

A floresta tradicionalmente funciona na fábula como uma metáfora para o mundo. E quando os pais pedem para que se evite o caminho pela mata, que é sombria e cheia de perigos, a lição final é que a vida também é sombria e cheia de perigos. Chapeuzinho Vermelho (Lilla Crawford) e João e o Pé de Feijão (Daniel Huttlestone), presentes no filme, são as manifestações máximas disso. É quando percorrem por entre as árvores, a pedido de seus pais, que irão aprender uma lição sobre como o mundo pode ser cruel. As outras histórias, Rapunzel (Mackenzie Mauzy) e Cinderela (Anna Kendrick), pegam emprestada essa simbologia, ausente em seus contos originais, mas acabam reforçando mais a questão do legado familiar.

A impressão é que, no palco, o espetáculo visual ajuda a perdoar a falta de razão de ser das atitudes dos personagens. Mas o filme não é tão bonito quanto Marshall parece acreditar, sobrando momentos que só servem para nos deixar confusos. A saber: a Bruxa oscila entre a vilania e a tragédia de forma que nem a interpretação de Streep salva; nunca chegamos a ter indícios de problemas conjugais entre o padeiro e sua mulher até que ela canta sobre como a floresta o mudou; Chapeuzinho aprende sua lição, mas faz um desafio estúpido e inconsequente; e, caso clássico, os personagens desaparecem sem deixar vestígios da metade para o fim do filme.

Tudo isso ainda poderia funcionar, caso o filme apresentasse um espetáculo visual com edição mais ágil, como acontece na sequência inicial. Daí em diante, não apenas o ritmo vai se deixando cair de forma irrecuperável como a encenação com um terrível ranço dos palcos não ajuda, coisa que fica bem clara na sequência em que os irmãos príncipes (Chris Pine e Billy Magnussen) disputam quem ama mais ou na maneira em que a bruxa entra e sai de cena.

Marshall já nutre uma nada saudável tendência em filmar como se estivesse encenando uma peça – Chicago, Nine e Memórias de uma Gueixa são provas cabais. Quando se propõe a adaptar um sucesso da Broadway, o resultado não teria como ser muito diferente.

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Luiz Gustavo Vilela

Luiz Gustavo Vilela é jornalista formado pela PUC-Minas, especialista em Comunicação e Cultura pela UTFPR, mestre e doutorando em Comunicação e Linguagens pela UTP. Entre 2011 e 2015 foi crítico de cinema no Portal POP.

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