Carisma de Tom Cruise não segura a onda de ficção científica

Se tem uma coisa que dá para falar sem medo sobre “Oblivon” é de sua beleza estética. Mesmo quando é feio e sujo, o filme ainda é absolutamente bonito. Todo o visual é bem cuidado. Dos figurinos aos grandes cenários, especialmente as ruínas de Nova York, passando pelos equipamentos utilizados pelos personagens, que parecem, ao mesmo tempo, avançados e perfeitamente humanos. Fora isso, porém, o filme não brilha. Não tem alma. É como uma embalagem muito bonita para um presente sem graça. O problema parece estar na história, reciclada de outras tantas obras de ficção científica.

Tom Cruise é Jack Harper. Um homem dedicado a dar manutenção em naves que se ocupam de proteger grandes equipamentos que estão convertendo a água da Terra em energia para ser usada pela humanidade que agora habita Titã. Isso porque nosso planeta foi invadido por uma raça extraterrestre. Nós ganhamos a guerra, mas isso nos custou o meio-ambiente. Quando terminar seu trabalho, Harper e sua mulher, Victoria, interpretada por Andrea Riseborough, partirão para Titã. Isso, claro, é o que eles pensam já que as coisas mudam com a chegada de Julia, feita por Olga Kurylenko. Ela possui uma estranha relação com Harper e, por trás dessa ligação pode estar um segredo, até então, muito bem guardado e que pode selar o destino de toda humanidade. Mas não se preocupe porque, caso fique confuso, Morgan Freeman vai aparecer para explicar tudo.

A trama é recheada de reviravoltas e surpresas. Nenhuma, claro, é exatamente supreendente se você está familiarizado com o cinema de ficção científica. Todas elas já foram exploradas melhor e mais originalmente em filmes como “2001 – Uma Odisseia no Espaço”, “Planeta dos Macacos”, “Vingador do Futuro”, “Matrix” e “Star Wars” – todos, inclusive, referenciados visualmente. Mas talvez o público-alvo do filme sejam adolescentes que ainda não possuem muito repertório cinematográfico e consigam até mesmo se surpreender com o roteiro.

“Oblivion” ultrapassa uma linha, nem sempre clara, que limita o espaço entre a homenagem e a cópia. Em grande medida, é isso que impede que nos relacionemos mais profundamente com os dramas de seus personagens. Outros filmes, que também não conseguem ser originais, se salvam ao conseguir esconder suas referências. Aqui, como há esse pensamento de homenagem, o tiro acaba saindo pela culatra. Também não ajuda muito o fato do roteiro parecer disperso, como se não houvesse urgência no convencimento de Harper em abraçar um dos dois discursos. E, quando ele afinal se decide, o clímax não compensa toda a antecipação, o que contribui para a opacidade no efeito final sobre quem assiste.

As grandes ficções científicas funcionam como metáforas sociais. E aqui isso não é diferente, operando em, basicamente, dois níveis distintos. Um envolve um homem que se volta contra um sistema que, através de mentiras, o manipula, o que evoca os melhores momentos de Phillip K. Dick e George Orwell. Ainda que seja bem inocente, é bonito que sua redenção esteja ligada ao amor verdadeiro e, de forma até enfática, na rejeição de um amor baseado em mentiras. A outra, mais sutil, envolve o self-made-man, herói americano, militarista que aparece quase como um messias, como um escolhido, servindo como última esperança da humanidade.

O que sobra é uma nova grande atuação de Cruise, sempre buscando pular de cabeça em seus papéis, em um personagem vazio – o que parece piorado com os outros atores que parecem completamente perdidos – e um visual esmerado. O que não é suficiente para que, meia hora depois de sair da sessão, você ainda se sinta marcado de alguma forma pelo que acabou de assistir.

Publicado originalmente no Portal POP.

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Luiz Gustavo Vilela

Luiz Gustavo Vilela é jornalista formado pela PUC-Minas, especialista em Comunicação e Cultura pela UTFPR, mestre e doutorando em Comunicação e Linguagens pela UTP. Entre 2011 e 2015 foi crítico de cinema no Portal POP.

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