Carros, corridas e vingança marcam “Need for Speed”

Need for Speed

Considerando o imenso desafio que é fazer uma adaptação decente dos games para o cinema, “Need for Speed” larga com certa vantagem pelas edições da série de jogos não terem nenhuma linha narrativa a ser seguida. O objetivo é explorar a cidade, fazer rachas, ganhar dinheiro, tunar o carro e correr da polícia. Ainda assim, há algumas armadilhas que podem aparecer para o filme. A maioria delas envolve a cabeça do produtor hollywoodiano médio que poderia dobrar o filme até ele se tornar uma versão sem alma de “Velozes e Furiosos”. Felizmente, não é o que acontece e o resultado final é até surpreendente.

Para um filme de corridas clandestinas e carros supervelozes, o começo é lento. E não há pressa em estabelecer o universo, os personagens e, logo, o conflito. Acompanhamos Tobey Marshall, vivido por Aaron Paul, um corredor habilidoso que luta para manter sua oficina mecânica ativa. Mas Dino Brewster, papel de Dominic Cooper, entra em seu caminho com uma proposta que começa salvadora, mas termina em tragédia.

Só então que “Need for Speed” assume sua filiação cinematográfica por natureza: o thriller de vingança. E o filme se desenvolve com Tobey atravessando os EUA para conseguir participar da mãe de todas as corridas clandestinas, e finalmente conseguir destruir a vida de Dino. Tudo, claro, servindo como uma desculpa para uma série de cenas de perseguição que são tão malucas quanto empolgantes. Desde a primeira – mais próxima visualmente dos cenários dos primeiros jogos -, sem trilha sonora incidental, contando apenas com o ronco dos motores, até a derradeira corrida do clímax.

Dentro disso, o principal acerto do filme é estabelecer Tobey como um herói trágico, ao invés de colocá-lo sob a estrela do herói vacilante, que precisa aprender a ter confiança em si mesmo antes de se tornar um verdadeiro campeão. O personagem criado por Paul nunca duvida de sua capacidade. Pelo contrário. Ele sabe que é melhor – mesmo que essa arrogância seja corresponsável pela sua tragédia pessoal para começo de conversa. Ainda assim, essa é uma aposta perigosa, considerando que é mais difícil do público criar identificação.

O resto são estratégias para simular o ambiente criado pelo jogo ao mesmo tempo em que o reapresenta para quem é de fora. Para a primeira parte estão os colegas da oficina de Tobey, especialmente Benny, vivido por Scott Mescudi, que faz o controle aéreo do tráfego, emulando a visão aérea do game, ao mesmo tempo que servem de alívio cômico. A responsável pela segunda é Julia, interpretada por Imogen Poots, que, por ser inglesa, mesmo dominando os conhecimentos técnicos sobre carros, é quem recebe todas as explicações sobre o que está acontecendo em cena. Além de ser um belo bálsamo para os olhos.

O resultado final é um filme surpreendentemente humano, ainda que seu coração seja bombeado por óleo de motor e gasolina aditivada. Isso, aliado às lindamente filmadas cenas de perseguição – chegando ao patamar de “Ronin” e “Operação França” sem nenhum débito neste quesito -, tornam perdoáveis os (poucos e conscientes) clichês ou a dependência de uma enorme forçada de mão que o final aconteça e faça sentido.

Publicado originalmente no Portal POP.

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Luiz Gustavo Vilela

Luiz Gustavo Vilela é jornalista formado pela PUC-Minas, especialista em Comunicação e Cultura pela UTFPR, mestre e doutorando em Comunicação e Linguagens pela UTP. Entre 2011 e 2015 foi crítico de cinema no Portal POP.

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