“Confissões de Adolescente” faz belo retrato de fase conturbada da vida

Confissões de Adolescente

O tempo passa e os dilemas adolescentes, pelo jeito, não mudam. Época de descobertas, inseguranças, experiências e decepções. Viver em uma sociedade conservadora não ajuda, mas a liberdade total, especialmente sem diálogo, também não é solução de todos os problemas. E, no meio disso tudo, mais perdido do que todos, está o próprio adolescente, que, imediatista nato que é, nem mesmo o alívio psicológico de pensar que “isso vai passar, mais dia menos dia” possui.

Daí vem boa parte da dificuldade de se retratar esse universo. São contradições demais, mesmo que recorrentes. E as tentativas de fazer isso olhando de fora costumam ser fracassadas – “Malhação”, folhetim adolescente da Globo, está aí para provar isso. É, em parte, por isso que “Confissões de Adolescente” segue imbatível no Brasil. A nova versão, agora em filme, feito com carinho por todos os envolvidos, atualiza o pouco que era necessário (vivemos um mundo mais rápido e interconectado que os anos 80, afinal), mas mantendo as qualidades do texto de Maria Mariana.

O mérito inicial do filme vai para o roteirista, Matheus Souza. Uma das poucas pessoas que consegue traduzir o universo jovem e evitar a pieguisse ou, pior, a comiseração. Nas mãos dele, as quatro irmãs e seus muitos amigos e colegas ressurgem como personagens absolutamente reais, condição básica para que a história convença. Tudo enfeitado com interações via redes sociais e referências pop-bacaninhas (a sequência que emula “Crepúsculo”, por exemplo, consegue ser tão cativante quanto engraçada).

Mas, claro, não só isso. A direção de atores de Daniel Filho – especialmente pelo feito raro de conseguir que o elenco se apropriasse do texto, evitando a embocadura travada típica do cinema nacional – é cheia de méritos. Além, claro, das próprias atrizes: Clara Tiezzi, Malu Rodrigues, Bella Camero e Sophia Abrahão, que fazem as quatro irmãs. Fora o destaque para Olivia Torres, em sua subtrama dramática envolvendo bulling, ecoando clássicos como “Carrie, a Estranha”.

A história não se contenta em abraçar a beleza e a leveza da adolescência – ainda que seja boa parte do que o filme mostra. Lidar com a própria sexualidade, com sentimentos alheios e dar os primeiros passos rumo à vida adulta é bonito na mesma medida em que é também absolutamente aterrorizante. E quando a vida real bate na porta, não há muito como fugir de volta para a barra da saia da mãe, na maioria dos casos.

Mas tudo isso seria pouco sem a essência fundamental da obra, que é, como já disse, o texto de Maria Mariana. A esperteza que há em colocar quatro irmãs, cada um com seu próprio dilema e complicação, vivendo sua própria versão do que que significa passar por aquilo tudo, em diferentes fases – desde a transição da infância para a adolescência e dela para a vida adulta – ajuda muito na identificação com o espectador. Você se sente representado por ter passado, estar passando, ou pela vaga noção de saber que, em algum momento, irá passar por aquilo. Fora a sensação geral de que, por mais que cada adolescência seja absolutamente única, as coisas continuam as mesmas.

Os ciclos não se fecham, parece postular o filme. Mas dão origem a novos ciclos.

Publicado originalmente no Portal POP.

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Luiz Gustavo Vilela

Luiz Gustavo Vilela é jornalista formado pela PUC-Minas, especialista em Comunicação e Cultura pela UTFPR, mestre e doutorando em Comunicação e Linguagens pela UTP. Entre 2011 e 2015 foi crítico de cinema no Portal POP.

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