“Elysium” usa ficção científica para fazer crítica social

Assim como “Distrito 9″, filme anterior do diretor Neil Blomkamp, “Elysium” é uma ficção científica com uma clara crítica social. Mas, ao contrário do primeiro, que usava uma metáfora mais discreta, do opressor tomando a forma e o lugar do oprimido, aqui não há sutileza. Há uma mensagem a ser entregue ao espectador e todos os elementos, estéticos ou narrativos, são uma desculpa para o fazer.

Blomkamp, novamente, opõe classes. Mas agora ambas são humanas. Os que vivem no satélite Elysium, semi-deuses, ricos, poderosos e, ainda por cima, virtualmente imortais – graças às tecnologias médicas -, e os que habitam sobre os escombros do que sobrou do favelizado planeta. Nem o ar da Terra, impuro pela poluição (criada pela ganância, diga-se), os da classe abastada toleram respirar. Mesmo assim, o estilo de vida da elite é sustentado com o trabalho em regime de escravidão disfarçada dos que estão na Terra.

Logo no começo do filme vemos que há um mercado negro calcado em levar habitantes da Terra para Elysium, buscando acesso à tecnologia médica que eles, integrantes da elite, monopolizam. Chegar lá não é tarefa fácil, permanecer é impossível, postula a trama. Max, o personagem de Matt Damon, por conta de um acidente, decide que também precisa chegar lá. E rapidamente a chave para lhe levar se torna a chave para todos os habitantes do planeta, o que o transforma em uma espécie de Prometeu relutante.

A ideia do mito grego não é apenas reforçada pelo nome do satélite – os Campos Elísios eram o correspondente mitológico para o Paraíso. A elite não é apenas é virtualmente imortal, como se recusa a dividir essa tecnologia médica com o resto do mundo. Para coroar isso há o sistema de vigilância, como o de “1984″, pelo qual é possível encontrar todas as pessoas do mundo em pouco tempo. Isso os torna a imagem das divindades gregas.

Blomkamp constrói uma Babel multicultural, tanto em Elysium, quanto na Los Angeles favelizada da Terra. E, para ilustrar isso, escolheu à dedo atores de diferentes etnias. Com destaque para os brasileiros Alice Braga e Wagner Moura e o mexicano Diego Luna. Cada um resguardando seus sotaques e línguas originais – e deve ser uma piada que o único outro idioma, fora o inglês, que se ouve em Elysium é o francês.

Nesse panorama é tentador criticar a escolha de Damon como protagonista. Ele é, assim como a vilã vivida por Jodie Foster, a encarnação do estereótipo caucasiano norte-americano. Faz parte, porém, da necessidade de que a mensagem de Blomkamp não apenas seja transmitida, mas que chegue ao maior número de pessoas possível. Coisa que Hollywood só consegue se contar com um ator do primeiro escalão como protagonista.

Isso deixa Blomkamp livre para pesar a mão em pequenas referências à luta de classes. Max, por exemplo, trabalha em uma fábrica de robôs-policiais. Os mesmos robôs que quebram seu braço e lhe perseguem depois. Ou seja, ele está inserido em um sistema em que, para garantir sua subsistência, ele precisa alimentar seus opressores. O que, inclusive, justifica a noção de intimidade com que conversa com o robô, fazendo piadas que são interpretadas pelo sistema como agressão verbal. A metáfora se aprofunda quando ele precisa recorrer a um exoesqueleto, adotando parte dos modos de agir de seus opressores.

Publicado originalmente no Portal POP.

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Luiz Gustavo Vilela

Luiz Gustavo Vilela é jornalista formado pela PUC-Minas, especialista em Comunicação e Cultura pela UTFPR, mestre e doutorando em Comunicação e Linguagens pela UTP. Entre 2011 e 2015 foi crítico de cinema no Portal POP.

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