Entrevistamos Marcelo Antunez, que nos contou tudo sobre “Qualquer Gato Vira-lata 2”

A história de Marcelo Antunez com cinema já é antiga. Mas, só agora, com “Qualquer Gato Vira-Lata 2″, é que seu nome aparece nos créditos como diretor, dividindo o posto com Roberto Santucci, seu parceiro de longa data. O POP conversou por telefone com ele sobre o trabalho, os desafios e os grandes méritos de seu filme.

“Qualquer Gato Vira-Lata 2″ é sua estreia como diretor, certo?

Assinando a direção, sim. Mas, na verdade, eu tenho uma parceria com o [Roberto] Santucci desde 2002, 2003. E a gente tem feito quase 100% desses filmes, desde “De Pernas pro Ar”, “Alucinados”, que não foi lançado no Brasil, “Até Que a Sorte Nos Separe”, eu sempre estava presente nesses filmes, mas nunca assinando a direção com ele. A gente tem uma parceria criativa junto, a gente troca muito no set, mas essa é a primeira vez que assinamos juntos.

Mudou alguma coisa na dinâmica com essa alteração de status?

Mudou. Mudou sim, um pouquinho. Na verdade, a gente está em uma estratégia de eu assumir mais as comédias, tocar mais para frente esses filmes que temos feito. O Roberto está querendo se dedicar mais a projetos pessoais. É lógico que ele vai continuar dirigindo comédias, mas ele tem alguns outros projetos de maior interesse dele. Eu estava cuidando do final de “O Candidato Honesto”, que a gente fez junto, e o Roberto já estava entrando para filmar “Loucas pra Casar”. E quando terminou, pintou a oportunidade do “Qualquer Gato Vira-Lata 2″, que foi um convite do Pedro Novaes. Não havia a menor possibilidade de o Roberto assumir da mesma maneira que a gente fazia antes. Então, a gente acabou jogando o filme mais para mim. Eu assumi a pré-produção sozinho. Durante as filmagens a gente dividiu a direção. E, durante a pós-produção, eu voltei a assumir sozinho, porque o Roberto estava envolvido na pré-produção de “O Herdeiro”, em que a gente dividiu a direção novamente. Então, “Qualquer Gato Vira-lata 2″ é um filme que eu acabei assumindo mais do que normalmente.

Teve algum momento em que você sentiu mais a responsabilidade, ficou sem dormir, ou foi tranquilo?

[Risos] Tem, tem. Nos outros filmes já teve um pouco, mas, é claro, não tem como negar, nesse mais. Tive que assumir mais o filme, até por essa indisponibilidade do Roberto, eu tive que realmente assumir mais, mas para mim foi um prazer. Primeiro que isso é o que eu mais gosto de fazer da vida. Embora seja muito trabalhoso.

Você vem trabalhando nesses universos que ajudou a construir desde a base, como “Até Que a Sorte Nos Separe”, “De Pernas pro Ar” e “O Candidato Honesto”. Como foi trabalhar em um filme que teve premissas estabelecidas por outras pessoas?

A gente até costuma brincar que assumir um projeto no meio do caminho, não no meio do caminho, mas uma continuação, é o mesmo que cuidar do filho dos outros. É lógico que quando a gente tem o nosso filho, a gente cuida, ama e tudo. Mas, quando o filho é dos outros, a responsabilidade é maior. E, no caso de um longa metragem, é igual. Tem um universo que foi bem definido pelo Tomás Portela no primeiro, tendo como base a peça do Juca de Oliveira, muito fiel na construção desses personagens e a gente não pode estragar isso. Se for para meter a mão, tem que ser positivamente. Tem todo um cuidado em usar esse universo, tirar o melhor disso e tentar dar um upgrade, agora que os personagens já foram apresentados no primeiro.

Uma coisa que me impressionou muito foi a sequência de abertura, que é um dos melhores momentos dessa leva de comédias nacionais. Você divide a tela ao meio e faz as falas dos personagens negarem as imagens, meio que dizendo para as pessoas prestarem atenção no que está acontecendo. Queria saber quão consciente foi isso.

No roteiro já havia uma ideia de apresentar essa diferença entre os personagens. Enquanto a Tati é impulsiva e institiva, o Conrado é metódico. E essa ideia de dividir a tela veio na montagem. Pensamos ‘poxa, porque não contamos essa história de forma paralela?’ Mostrar os dois e suas diferenças ao mesmo tempo, tentando costurar um certo carinho entre eles, os olhares, um pouco do que está sendo dito, mas deixar claro essa diferença. É a piada. O Conrado fala que as mulheres são calmas, protetoras do ninho, enquanto os machos são focados e, na verdade, o que está acontecendo ali é uma reversão de expectativas. A ideia foi reforçar ainda mais o que já existia no roteiro, que é a apresentação desses personagens, mas de uma maneira gráfica. Que a gente possa ver bem a diferença entre os dois e pontuando essas piadas.

As filmagens aconteceram todas em Cancún, no México?

É um misto. A história inteira se passa em Cancún, no México, tirando as cenas iniciais e as do apartamento de Marcelo e Magrão. Foi uma composição que tivemos que fazer por conta da indisponibilidade do Malvino Salvador, que estava em cartaz com uma peça quatro dias da semana, de quinta a domingo, então, não havia possibilidade de filmar tudo em Cancún. O que a gente fez foi arranjar uma composição de locações que estivessem todas afinadas e pudessem contar todas a mesma história. No sul da Bahia, a gente encontrou um resort que é do mesmo grupo do de Cancún. Fazendo pesquisa de locação, percebemos que a arquitetura era igual. Essa área de piscinas, corredores, externas a gente filmou na Bahia, os quartos de hotel a gente filmou aqui no Rio, e todos os exteriores, de verdade, cenas de praia, a gente filmou em Cancún.

É bem magia do cinema mesmo, né?

É. Tem cena que você olha para um lado, ela está olhando para Cancún, você olha o contra-plano, está na Bahia, e ela termina a cena no Rio [risos]. Mas faz parte.

Uma coisa interessante em “Qualquer Gato Vira-lata 2″ é o fato de a Tati fazer o pedido de casamento, com uma inversão que não agride o machismo típico brasileiro, mas faz a pauta avançar. E isso, dentro de uma comédia romântica, em que os estereótipos são muito bem definidos.

Isso é do Paulo Cursino, nosso roteirista. E é reflexo do tempo, não tem mais espaço para seguir esse padrão secular, esse machismo. A gente vive uma outra época, a mulher tem um outro papel na sociedade e em relacionamento mais ainda. A mulher saber muito bem o que quer e o espaço que ocupa, livrando-se dessas amarras. E uma comédia romântica de hoje não podia ser diferente. Se há um pedido de casamento, porque não a mulher fazer? E, no caso do nosso filme, a Tati é uma personagem que faria isso. Ela tem convicções, atitudes, é forte, tem pulso, não tem receio de se expor. Então, cai como uma luva.

Esse filme parece ter um ritmo um pouco mais interessante que o primeiro. Sei que é complicado comparar os dois, já que foram feitos por pessoas diferentes, mas a diferença é gritante. E como comédia é puro ritmo, quero saber como vocês trabalharam isso.

Cada gênero se adequa a um ritmo de montagem diferente. O humor de hoje tem essa pegada de ritmo mais acelerado, de tempo de piada. Às vezes, a gente dilata um pouco para as pessoas rirem, mas você tem que fechar a piada de maneira rápida. A gente vai testando, vendo a reação do público, mas é o tipo de ritmo que a gente gosta de imprimir. A gente tem até um momento do filme em que o Conrado pega a Tati na cama com o Marcelo e daí emenda em uma sequência de cenas em que a gente mergulha um pouco no drama, para sentirmos mesmo que momento é esse pelo qual os personagens estão passando, então você dá uma freada na comédia para mergulhar no drama. E você vê que os cortes ficam mais espaçados, mais lentos, mas depois voltamos a acelerar para a resolução no final.

Como foi trabalhar com Fábio Jr., essa lenda nacional?

Esse personagem nasceu no começo como a mãe da Tati, que não necessariamente seria a mãe da Cleo, no caso a Gloria Pires. Conversando entre a gente, chegamos a cogitar, porque não chamamos a Gloria? De repente, quem sabe, o Fábio, né? Mas tiramos da cabeça, porque sabemos do passado e não queríamos mexer nisso. Mas, já na primeira leitura de roteiro com a Cleo, falamos de chamar a Gloria e ela falou, ‘poxa, por que não meu pai?’. A gente falou ‘seu pai? Seu pai? Tudo bem para você?’ [risos]. E ela disse ‘tudo ótimo’. A gente entrou em contato com o Fábio, ela também ligou, e ele recebeu isso super bem, porque ele queria ensaiar essa aproximação com ela e viu nisso uma oportunidade. E foi sensacional. Ele veio com muita felicidade para fazer a cena. Foi muito emocional. Teve uma carga emocional muito grande. Quando terminou a cena da praia, que era a mais emocionante, estava a equipe toda chorando.

Publicado originalmente no Portal POP.

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Luiz Gustavo Vilela

Luiz Gustavo Vilela é jornalista formado pela PUC-Minas, especialista em Comunicação e Cultura pela UTFPR, mestre e doutorando em Comunicação e Linguagens pela UTP. Entre 2011 e 2015 foi crítico de cinema no Portal POP.

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