Filme sobre 911 faz grande homenagem aos thrillers dos anos 90

Por algum motivo, o cinema de Brad Anderson só voltou a ter algum destaque agora, com “Chamada de Emergência”. Isso é curioso para alguém que esteve à frente de “O Operário”, filme que tem o trabalho mais devastador da carreira de Christian Bale, ainda antes de encarnar o Batman. Entre um e outro foram quase dez anos, dois longas que passaram ao largo das grandes distribuidoras, e muito trabalho em episódios de séries (algumas muito boas, como “The Wire”). O ponto é que “Chamada de Emergência” está anos-luz de sua performance em “O Operário” – o que nem quer dizer que seja um filme ruim. Mas se ele serve para colocar Anderson nos holofotes, é muito bem-vindo.

No filme, Halle Barry é Jordan, uma das muitas pessoas que cuida de atender o telefone quando alguém liga para o 911 em Los Angeles. Em um plantão normal ela comete um erro e isso custa a vida de uma pessoa. Alguns meses depois, ainda traumatizada, ela trabalha no treinamento de novos atendentes quando acaba assumindo o trabalho de uma nova vítima, precisando superar seus medos e traumas.

O novo caso envolve uma jovem chamada Casey, interpretada por Abigail Breslin (isso mesmo, a menina de “Pequena Miss Sunshine” está crescendo). Ela é sequestrada e acaba indo parar no porta-malas de um carro, onde consegue ligar para a emergência. Mas isso é só a ponta do iceberg. O que se segue é um thriller que faz jus ao gênero. Nos poupa de sustinhos fáceis e, ao contrário, cria um clima de tensão que, pouco a pouco, só aumenta. Isso porque o filme assume um quase-tempo-real, onde vemos o desespero da vítima e da atendente enquanto tentam encontrar maneiras da primeira ser salva pela polícia, sem que o sequestrador desconfie.

No fundo, o “Chamada de Emergência” é uma grande homenagem aos thrillers dos anos 90 que, por sua vez, prestavam suas reverências ao cinema de Alfred Hitchcock. A sequência final, por exemplo, homenageia, ao mesmo tempo “O Silêncio dos Inocentes” e “Psicose”. Inclusive ao focar nas protagonistas femininas. Mas dá um passo além ao evitar a saída fácil (e, no caso desse filme, seria fácil demais até) de colocar um cavaleiro de armadura que parte em direção ao resgate da vítima. E, talvez ainda mais importante que isso, não faz como uma bandeira feminista, mas de forma bastante natural e plausível.

Tudo é reforçado pela escalação de elenco. Halle convence, ainda que esbarre no exagero uma ou duas vezes, enquanto Abigail está simplesmente irretocável como uma adolescente mimada que se vê em uma situação extrema. Sua primeira, segunda, terceira e quarta reações são de pânico. O que potencializa o clima de tensão. O sequestrador, interpretado pelo desconhecido Michael Eklund, é outro dos trunfos do filme, já que, como não conhecemos seu rosto, ele acaba sendo mais ameaçador.

O filme engrena mesmo na segunda metade, quando Anderson resolve abandonar certos maneirismos que podem ser meio irritantes para alguns espectadores. Especialmente nas cenas de luta, em que ele escolhe um efeito que mais lembra seriados policiais da TV como “CSI”. Não ajuda que o formato seja mais quadrado que o retangular quase obrigatório do cinema contemporâneo. Faz sentido que isso esteja lá para reforçar a homenagem aos thrillers noventistas, mas o efeito final, infelizmente, distrai mais do que deveria.

Por sorte, as qualidades são bem superiores.

Publicado originalmente no Portal POP.

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Luiz Gustavo Vilela

Luiz Gustavo Vilela é jornalista formado pela PUC-Minas, especialista em Comunicação e Cultura pela UTFPR, mestre e doutorando em Comunicação e Linguagens pela UTP. Entre 2011 e 2015 foi crítico de cinema no Portal POP.

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