Game of Thrones S07E01 – Dragonstone

Texto com spoilers de Game of Thrones. Leia por sua conta e risco.

Game of Thrones inovou pouco em seu retorno para a sétima temporada. Dragonstone, assim como a maioria dos episódios que abriram as últimas temporadas, possui uma função prioritariamente didática, responsável por nos ressituar em relação aos personagens ao mesmo tempo em que os reposicionam no tabuleiro de Westeros. Não por acaso a imagem literal de um tabuleiro com o mapa dos Sete Reinos aparece com destaque, reforçando a ideia de “jogo”, ao menos duas vezes: na conversa entre Cersei e Jaime Lannister (Lena Headey e Nikolaj Coster-Waldau) e na sequência final com Daenerys Targaryen (Emilia Clarke).

Não quer dizer que este tenha sido um episódio sem bons momentos. Arya Stark (Maisie Williams) completa sua vingança sobre a Casa de Frey em uma dessas passagens épicas – “o Norte se lembra; O inverno chegou para a Casa de Frey”. Em outra, a real dimensão da rotina de Sam Tarly (John Bradley) em sua busca por conhecimento que poderá auxiliar Jon Snow (Kit Harington) é demonstrada em uma bela e ágil edição. O ápice do episódio, porém, tanto pela carga dramática quanto pela cômica e relevância simbólica, é dado por Sandor Clegane (Rory McCann), o Cão.

Clegane está perambulando pelo Norte junto do grupo de guerreiros devotos do Deus da Luz. Entre uma tirada e outra – “você é careca e esse seu coque não engana ninguém” – o Cão tem uma revelação religiosa: percebe a estupidez da guerra e se sente tocado pela efemeridade da vida em uma reflexão existencialista pouco usual para o personagem. A atitude tipicamente cínica de Clegane é substituída por outra mais empática depois de um momento de iluminação espiritual diante do fogo, manifestação do Deus da Luz.

Esta é talvez a primeira vez que Game of Thrones trata de sua oposição temático-espiritual de forma tão explícita. Se os White Walkers, mortos-vivos do gelo, são reais, seu oposto só pode ser uma força da luz e do fogo. Esta parece ser a origem do raciocínio por trás desta relativamente nova religião dos Sete Reinos, que por conseguir operar milagres reais (ressurreição e visões) deve estar calcada em alguma base factual dentro da mitologia da série. O que não quer dizer que seja uma oposição de simplicidade maniqueísta.

Tomemos as manifestações humanas dos pólos opositores: Daenerys Targaryen (fogo) e Jon Snow (gelo). Mesmo que suas narrativas os aproximem simbolicamente dos extremos elementais, afirmar que eles incorporam radicalmente os ideais que são evocados pelo fogo e pelo gelo é um exagero. A nuance em relação aos dois, sua moral fluida e intenções conflituosas, está no cerne do jogo dos tronos, o que se extrapola tanto para os White Walkers quanto para o Deus da Luz. Nada é inerentemente bom ou ruim neste universo.

Por isso o debate central de Dragonstone é sobre o que proteger, como proteger, com quem e como forjar alianças. Com o fim próximo e os protagonistas claramente definidos sobra entender quais são os movimentos que irão incorrer em menos perdas. Defender Westeros dos White Walkers pode custar para Jon Snow a soberania do Norte. Daenerys pode conquistar King’s Landing, mas de nada adiantará se os Mortos atravessarem a Muralha. Mesmo Cersei, cada vez mais enlouquecida por um projeto de poder pelo poder, se dá conta de que precisa de aliados.

Por fim, uma ou duas palavras sobre Ed Sheeran: a presença do cantor pop incomoda por nos distrair, nos lembrar que estamos vendo um programa de televisão em um momento em que estamos mais profundamente mergulhados na trama. A cena toda já é problemática por ser um ápice didático em um episódio excessivamente didático – sua função é nos dizer que Arya está indo para King’s Landing e não para Winterfell. Ao mesmo tempo, porém, ela está ali para nos lembrar como os debates que ocorrem nos grandes salões dos castelos se refletem na vida dos homens comuns, um discurso que tendia a ser eliminado com o explosivo desfecho da sexta temporada. Fica empatado.

Leia aqui os textos de cada episódio das duas últimas temporadas.

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Luiz Gustavo Vilela

Luiz Gustavo Vilela é jornalista formado pela PUC-Minas, especialista em Comunicação e Cultura pela UTFPR, mestre e doutorando em Comunicação e Linguagens pela UTP. Entre 2011 e 2015 foi crítico de cinema no Portal POP.

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