Homens, Mulheres e Filhos

É um erro pensar em Homens, Mulheres e Filhos como um filme que se debruça sobre os malefícios das tecnologias de comunicação modernas. Ao contrário, é um filme que faz uma panorâmica sobre as relações humanas, retratando uma série de indivíduos que com ou sem tecnologia estariam igualmente perdidos. Os celulares, MMORPGs, redes sociais, sites de namoro e pornografia virtual só estão lá por uma questão de recorte. De prisma. O filme pretende entender esses personagens pela forma como usam estes artifícios.

A palavra “panorâmica” do primeiro parágrafo não foi gratuita. Jason Reitman, diretor e roteirista, importa do livro de mesmo nome, escrito por Chad Kultgen, essa noção de recorte social. O filme passa por uma série de famílias, ligadas pelo fato de viverem próximas umas às outras e terem filhos adolescentes frequentando o mesmo colégio. Cada um desses personagens é mais um estereótipo social, em relação ao uso de tecnologia, do que um indivíduo completo.

Temos um jovem viciado em jogos virtuais que praticamente abandona a vida social por causa disso, algo que só piora depois da separação dos pais. Ele começa uma amizade com uma menina cuja mãe é absolutamente paranóica em relação à vigilância virtual, chegando ao cúmulo de ler todas as mensagens e rastrear os movimentos dela via GPS. Tudo pelo bem dela, claro. Na outra ponta está um casal que já não sente a chama do casamento e vai atrás de formas de traição via sites de encontro e prostituição. O filho deles é viciado em pornografia e teme não conseguir atender às expectativas de sua namorada. Ela, por sua vez, é a garota mais popular da escola, que tenta uma carreira em Hollywood e, com a ajuda da mãe, mantém um site cheio de fotos provocantes. Fechando esse ciclo vem uma amiga dela, que se sente inadequada e conta com apoio online para conseguir resistir à tentação de comer.

Reitman brinca de mágico. Ele chama atenção para a tecnologia ao colocá-la no centro de cada cena, tanto de forma gráfica quanto narrativa. Assim, o diretor finge alimentar os nossos medos de isolamento e alienação enquanto, na verdade, trata de problemas que atravessam os tempos. Não é o acesso fácil à pornografia que faz o marido se desinteressar pela mulher. Também não é o Twitter a primeira fonte de informações sobre bulimia (no mau sentido). Tampouco é a internet o motivo que levou a primeira mãe a ficar paranóica com sua filha.

Nosso isolamento e alienação transcende os smartphones, tablets e redes socais, que, na verdade, são claros gritos de necessidade de comunicação, de contato, de compreensão. E os personagens de Homens, Mulheres e Filhos, ao não encontrarem vazão para essas necessidades em seus familiares e amigos, não têm outra escolha a não ser se expressar e buscar se conectar pela internet.

O resultado são personagens absolutamente perdidos. Cheios de informação, mas sem saber o que fazer com isso. Encontrando mais compreensão na tela fria de seus aparelhos do que em quem deveria melhor lhes conhecer. O desfecho, anticlimático por natureza, em que se estabelece que pouco há o que se fazer em relação a isso a não ser fingir que está tudo bem, mira no agridoce das boas comédias dramáticas, mas acerta no brutal.

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Luiz Gustavo Vilela

Luiz Gustavo Vilela é jornalista formado pela PUC-Minas, especialista em Comunicação e Cultura pela UTFPR, mestre e doutorando em Comunicação e Linguagens pela UTP. Entre 2011 e 2015 foi crítico de cinema no Portal POP.

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