Little Boy – Além do Impossível

Little Boy - Além do Impossível

A mensagem que Little Boy – Além do Impossível (Little Boy, 2015) quer passar envolve a quebra do ciclo de ódio histórico com uma mensagem de amor cristão e tolerância. A fé move montanhas, literalmente. Mas um exame mais aprofundado reforça o velho adágio: “de boas intenções o inferno está cheio”. A lição final do filme é de que a violência compensa desde que dirigida àqueles que praticam o mal.

No centro da trama está Pepper Busbee (Jakob Salvati), um garoto que vive em uma pequena cidade do litoral da Califórnia. Seu tamanho consideravelmente menor do que os colegas da mesma idade lhe rendeu o apelido de “Little Boy”, além de seguidas perseguições pelas ruas. A coisa piora muito depois de seu pai e grande amigo, James (Michael Rapaport), precisa ir para a guerra no front do Pacífico. Quando o pai é dado como desaparecido nas Filipinas o pequeno Pepper apela para os poderes da fé cristã para o trazer de volta.

Assim Little Boy se divide entre a missão do garoto de reforçar sua fé, o que faria Deus trazer seu pai de volta (se Ele assim quiser), e sua relação com o garoto que o atormenta. Algumas subtramas ajudam a reforçar a carga dramática, como o mundo de fantasia criado por James para Pepper – tornando-o mais suscetível à fantasia mitômana – e a relação com o irmão mais velho, London (David Henrie), que desconta a frustração de não ir à guerra – obrigando seu pai a assumir o posto da família – no único japonês que vive na cidade, o Sr. Hashimoto (Cary-Hiroyuki Tagawa).

Então, na superfície, a mensagem de Little Boy envolve tolerância e aceitação porque para fortalecer a sua fé Pepper aprende que não pode guardar ódio em seu coração. E isso envolve se tornar amigo de Hashimoto, coisa mal vista em uma cidade que tem americanos indo ao Pacífico e perdendo suas vidas para o exército nipônico. Hashimoto sofre, guardadas as devidas proporções, a mesma perseguição que Pepper por ser diferente. Mas a forma como o jovem resolve o problema do bullying dá uma dica de que essa mensagem não está exatamente bem desenhada.

Da mesma forma que não é exatamente uma saída cristã dar uma lancheirada na cara de um garoto que o esta perseguindo e atormentando – apesar de ser bastante catártico –, comemorar que uma bomba atômica foi lançada sobre uma cidade chacinando milhares de pessoas também não é. A crueldade é dupla para com os protagonistas, já que a cidade relaciona o nome da bomba, “Little Boy”, com o apelido do garoto, lhe tornando diretamente responsável pelo massacre, ao mesmo tempo em que ninguém se importa em saber se alguém da família que Hashimoto deixou para trás vive perto de Hiroshima ou Nagasaki.

Little Boy se torna a antítese da mensagem que pensa estar passando. Como é possível ser tolerante e violento ao mesmo tempo? Como é possível criticar o bullying praticando bullying? Como comemorar o fim de uma guerra se para isso foi necessário assassinar centenas de milhares de civis? É preciso ser muito obtuso para pensar que este é um desfecho adequado para um filme infantil.

Depois de uma sessão de Little Boy – Além do Impossível a única atitude honesta é ver ou rever Rapsódia em Agosto (Hachi-gatsu no kyôshikyoku, 1991) do mestre Akira Kurosawa. Nele jovens japoneses absolutamente americanizados começam a compreender sua herança ao conviver com sua avó, uma sobrevivente de Hiroshima. Aí sim é possível uma lição de tolerância.

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Luiz Gustavo Vilela

Luiz Gustavo Vilela é jornalista formado pela PUC-Minas, especialista em Comunicação e Cultura pela UTFPR, mestre e doutorando em Comunicação e Linguagens pela UTP. Entre 2011 e 2015 foi crítico de cinema no Portal POP.

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