Muitos acertos e poucos erros tornam “X-Men: Dias de um Futuro Esquecido” memorável

X-Men: Dias de um Futuro Esquecido

O futuro mostrado na sequência de abertura de “X-Men: Dias de um Futuro Esquecido” reforça a temática central da série, que é sua mensagem mais forte. A do absurdo da intolerância ao diferente. É por isso que começamos vendo uma espécie de campo de concentração para mutantes – aparentemente alijados de seus poderes – no meio de Manhattan.

Ainda que não seja o preconceito (racial? Interespécies?) o condutor da narrativa, mas sim a missão dos X-Men de fazer Wolverine voltar no tempo para evitar o apocalipse mutante – já chego nisso -, ele está presente em todas as cenas. Como esteve nos dois primeiros filmes da franquia e foi retomado em “Primeira Classe”, quando a oposição entre Magneto e Professor X, por conta da ambientação nos anos 60, fazia um claro paralelo claro com Malcom X e Martin Luther King, respectivamente. “Dias de um Futuro Esquecido” extrapola isso, em parte, unindo a sensação de perseguição crescente de “X-Men” e “X2″ com a veia da ação política do último. E sim, ao que tudo indica, “X-Men 3 – O Desafio Final”, foi, em parte, desconsiderado.

Isso porque, do ponto de vista narrativo, a quinta aventura dos mutantes no cinema tem uma missão clara: conseguir unir a trilogia original e o filme anterior, “X-Men: Primeira Classe”. Tarefa inglória que só é realizada em parte. O universo fica, mais ou menos coeso e há uma boa desculpa para a presença da maioria dos heróis – e olha que são muitos – em cena. Mas a linha do tempo ainda permanece bastante bagunçada. A questão é que pouco importa, já que as cenas de ação são, de longe, as melhores de toa a franquia e o roteirista, Simon Kinberg, consegue fazer de forma linear e quase didática uma história que tinha tudo para ser confusa.

A ideia é fazer com que Wolverine volte no tempo para evitar o acontecimento de um evento específico, que garantiu que, ao mesmo tempo, o governo americano bancasse o programa Sentinela, desenvolvido pelo Doutor Bolivar Trask, muito bem interpretado por Peter Dinklage, e que eles desenvolvessem uma tecnologia que faria frente aos poderes dos mutantes. Todo o resto do roteiro de Kinberg gira em volta disso, mesclando com a necessidade de colocar a maior quantidade de mutantes possível em cena.

A maioria funciona bem, como a ampliação da Mística, personagem de Jennifer Lawrence, que tem o melhor arco do filme, na verdade, ao lado do do Professor X (versão jovem, interpretado por James McAvoy). Alguns outros ficam forçados, como ter sido Kitty Pride, vivida por Ellen Page, a responsável de mandar a consciência de Wolverine para o passado – o que foi pensado como uma piscada de olho para quem leu os quadrinhos acaba sem sentido pela natureza dos poderes dela.

Mas não é apenas nisso que o roteiro funciona. O encadeamento – com aquela ajuda da edição – é brilhante. As cenas de ação são alternadas com cenas dramáticas em relação ao passado e o futuro. Então, quando está com mais tensão emocional, o outro é mostrado, ao mesmo tempo, mais vibrante. O ápice disso é no clímax, meio morno no passado, mas bastante agitado no futuro. E como são realidades interdependentes, a conexão ainda faz mais sentido, já que os acontecimentos de um determinam a existência ou não do outro.

Isso implica, também, em uma grande qualidade inédita em toda a franquia: cenas de ação realmente inteligentes. Pela primeira vez um coreógrafo pensou em formas criativas de mostrar os personagens usando seus poderes em batalha. Isso fica particularmente claro no futuro, para demonstrar que os X-Men são um grupo que já está bastante acostumado a lutar em conjunto. O ápice é com os portais de Blink, papel de Fan Bingbing, que servem de suporte tático para a equipe, e com Bishop, vivido por Omar Sy, cujos companheiros nem piscam para lhe energizar quando ele solicita.

O clímax é morno porque a chave para a solução dos acontecimentos do passado não é a eclosão de uma grande batalha. É o contrário disso, na verdade. O que é sensacional, do ponto existencial do filme – mérito, sem dúvidas, para o diretor Bryan Singer, gay assumido e que entende bem de preconceito. E resolve, claro, a linha do tempo estabelecida na franquia, ainda que muita coisa siga não fazendo sentido (porque não ouvimos falar dos Sentinelas na primeira trilogia, por exemplo?)

Mas a alma de “X-Men” é a da ficção científica. E não há nada que não possa ser remendado com outras viagens no tempo, mais para frente.

Publicado originalmente no Portal POP.

Sobre o autor Veja todos os posts

Luiz Gustavo Vilela

Luiz Gustavo Vilela é jornalista formado pela PUC-Minas, especialista em Comunicação e Cultura pela UTFPR, mestre e doutorando em Comunicação e Linguagens pela UTP. Entre 2011 e 2015 foi crítico de cinema no Portal POP.

Leave a Reply

Your email address will not be published. Required fields are marked *