“Noite Sem Fim”

Liam Neeson nunca foi avesso ao cinema de ação. Flertou com o gênero ao longo de toda a sua carreira, desde o longínquo “Darkman – Vingança Sem Rosto” até este “Noite Sem Fim”, passando por “Batman – Begins” e “Star Wars: Episódio I – A Ameaça Fantasma”. Mas foi em “Busca Implacável”, de 2008, que ele desenvolveu essa persona, do homem mais velho, dono de um passado violento, mas ainda cheio de recursos e habilidades que serão usados quando sua vida ou a de seus entes queridos estiver em jogo. Figura herdeira direta dos faroestes tardios de John Wayne e Clint Eastwood, inclusive.

Como Neeson é um ator de recursos dramáticos particulares, mesmo havendo uma constância em todos esses personagens pós “Busca Implacável” (“Desconhecido”, “A Perseguição”, “Caçada Mortal” e “Sem Escalas” para ficar nos mais gritantes), ele ainda consegue imprimir um aspecto distintivo interessante. Uma característica única surge em cada uma dessas figuras que serve não apenas para nos fazer diferenciar um filme do outro, mas também funciona para ajudar a criar um drama palpável.

Em “Noite Sem Fim” Neeson é Jimmy Conlon, um assassino da máfia irlandesa que gasta seus anos de aposentadoria afogando a culpa das mortes que cometeu em qualquer coisa alcoólica que puder colocar as mãos. Mas aí chega a noite de Natal e o caminho do seu filho Mike, papel de Joel Kinnaman, cruza com o de Dany, interpretado por Boyd Holbrook, que, por sua vez, é filho do chefão da organização criminosa para quem trabalhou a vida toda. Chefão este que, além de tudo, é seu amigo de infância.

A ação, bem filmada e coreografada, fica por conta da corrida contra o tempo de Jimmy e Mike para sobreviver por essa noite enquanto Shawn, vivido por Ed Harris, mobiliza toda a máfia irlandesa para os pegar. O drama fica no confronto entre os antigos amigos e entre pai e filho, com o personagem de Neeson no centro tentando fazer o que considera o certo.

O climax dramático, inclusive, fica na conversa entre Jimmy e Shawn em um restaurante no meio de Nova York. O diálogo é construído por frivolidades que disfarçam a tensão entre os personagens, outrora amigos inseparáveis. Quando o personagem de Neeson resolve que não há forma de proteger o filho sem sacrificar a amizade é que ele encara sua redenção. É quando ele se torna perigoso de verdade e não o bêbado que se tornou uma piada entre os gângsters locais. Mérito do ator por fazer uma construção tão complexa em um filme que tão poucos elementos para isso (ainda que Harris segure bem as pontas, como era de se esperar).

Quem conhece thrillers urbanos contemporâneos não vai encontrar nenhuma grande surpresa. Há alguma graça nos movimentos de câmera de Jaume Collet-Serra, em sua terceira colaboração com Neeson, ainda que eles acrescentem pouco narrativamente. Exemplo maior são as transições, que dá grandes saltos entre lugares diferentes partindo de um detalhe para a panorâmica da cidade e de volta ao detalhe. É bonito, mas só. Eles podem até mesmo distrair, diminuindo a força de cenas como o já citado diálogo entre Shawn e Jimmy, em que o quadro fica girando em volta dos dois.

O resultado final é o de mais uma exaltação de Neeson como herói de ação tardio. Se não há a graça da surpresa de “Busca Implacável” ou o roteiro deliciosamente redondo de “Sem Escalas”, há sua figura. O que segue bastando.

Publicado originalmente no Portal POP.

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Luiz Gustavo Vilela

Luiz Gustavo Vilela é jornalista formado pela PUC-Minas, especialista em Comunicação e Cultura pela UTFPR, mestre e doutorando em Comunicação e Linguagens pela UTP. Entre 2011 e 2015 foi crítico de cinema no Portal POP.

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