Porque qualquer reunião entre Pacino, Walken e Arkin vale a pena

Em um momento de “Amigos Inseparáveis”, Valentine, Val para os íntimos, resolve que precisa se confessar. Ele diz (cito de memória): “não vou falar sobre tudo o que eu já fiz. Vou falar sobre hoje a noite. Hoje eu transei com uma prostituta, usei drogas, me embebedei, fugi da polícia, enterrei um amigo e atirei em duas pessoas.” O humor negro dá o tom, que é sublinhado pelas atuações.

E se você tem Al Pacino, Christopher Walken e Allan Arkin no seu elenco, não importa muito o roteiro, certo? Certo. Isso vale especialmente para os dois últimos. Então, todo o ponto de “Amigos Inseparáveis” é colocar esses três atores, conversando sobre nada muito especial, deixando que eles fiquem responsáveis por criar uma sutil tensão que fica em subtexto. Há algo sobre o qual eles não querem falar, antes que a noite termine.

Por `noite`, não entenda uma metáfora forçada. Val, personagem de Pacino, está saindo da cadeia depois de 28 anos. Todos eles sem abrir o bico e entregar seus parceiros. Daí o título original: stand up guy é o cara que não cedeu à pressão. Quem o busca é o antigo parceiro, Doc, papel de Walken. Juntos, eles têm apenas uma coisa a fazer: reviver os velhos tempos. Para isso eles resolvem tirar Hirsch, o motorista, interpretado por Arkin, do seu asilo.

De tempos em tempos, os bons atores de uma geração ficam velhos. Então abraçam o cinema saudosista. Val é uma espécie de mistura de todos os criminosos interpretados por Pacino, se chegassem a essa idade sem morrer (a maioria morre já em seus filmes mesmo). E é ótimo que ele chegue a fazer o “uh-ha”, de “Perfume de Mulher”. Enquanto Doc é Walken em paz com as loucuras de seu “Franco Atirador”. E se Arkin não tem tantos criminosos em seu passado como ator, também não fica atrás construindo um ótimo piloto de fugas.

“Amigos Inseparáveis” não funciona como filme de gênero, se afastando de rótulos como `thriller` ou `comédia`, apesar de ter tensão narrativa e momentos engraçados. Seu correspondente literário talvez seja “Ulisses”, de James Joyce, no sentido de interessar muito mais a jornada desses personagens, especialmente Val e Doc, noite afora – ou, forçando menos a barra, “Curtindo a Vida Adoidado”. No meio do caminho, emula-se o melhor do cinema de Quentin Tarantino nos anos 90, o que envolve alternar alguma violência gráfica com diálogos que beiram o surreal. Tudo para que os laços entre esses personagens fiquem melhor realçados.

Não demora muito, descobrimos a agenda secreta por trás de toda essa amenidade. E isso revela o pior do filme por dois motivos. Quebra com a sutileza com que os atores vinham tratando a questão e enfraquece o final, ainda que a decisão de fazê-lo relativamente aberto seja, no mínimo, corajosa. Há, ainda, a consequência indireta de fazer com que o filme perca ritmo, e se arraste um pouco lá pelo meio.

Nada disso chega a atrapalhar. Basicamente porque não importa. A diversão aqui é ver Pacino, Walker e Arkin fazendo o que sabem fazer melhor.

Publicado originalmente no Portal POP.

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Luiz Gustavo Vilela

Luiz Gustavo Vilela é jornalista formado pela PUC-Minas, especialista em Comunicação e Cultura pela UTFPR, mestre e doutorando em Comunicação e Linguagens pela UTP. Entre 2011 e 2015 foi crítico de cinema no Portal POP.

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