“Sem Dor, Sem Ganho” é tão vazio quanto o sonho americano que busca retratar

O Sonho Americano dá a tônica de “Sem Dor, Sem Ganho”. Não que precise ser um gênio para perceber como a trama reflete os anseios de um povo que se acostumou a ser melhor do que todo o resto do mundo. A expressão “Sonho Americano” é repetida milhares de vezes ao longo da trama pelos personagens. E, assim como o próprio Sonho Americano, o filme é uma explosão de euforia completamente vazia, tanto para seus participantes dentro da trama, quanto para os espectadores.

Somos avisados no começo da exibição que é tudo baseado em fatos reais. E caso isso não esteja muito claro, seremos lembrados disso quando a coisa ficar esdrúxula demais. A própria premissa é, afinal, um bocado estranha para a realidade. Temos três bombados, ratos de academia, que, cansados de serem achatados pela sociedade e pelo sistema financeiro resolvem sequestrar um empresário para um esquema de extorsão. Tudo baseado no discurso de palestras de auto-ajuda fajutas e na crença de que o esforço deles para a construção de seus corpos os torna seres superiores. Mais ou menos o que o americano médio pensa em relação a seu poderio militar.

A coisa fica acirrada porque os três “legítimos americanos”, homens que se constroem por si mesmos, acham injusto que um colombiano (meio judeu) esteja mais rico do que eles. Em suas cabeças alucinadas com o discurso patriótico eles estão apenas corrigindo uma injustiça. Eles merecem muito mais aquele dinheiro/estilo de vida do que o imigrante que usa “babaquice” como método de gestão.

Parte da simpatia do filme fica nas mãos do carismático elenco. Encabeçado por Mark Wahlberg, que é o pensador do time, instrutor de academia que é bem esperto, mas não é, nem de longe, tão inteligente quanto pensa que é. A seu lado está Anthony Mackie, um marombeiro frustrado por não conseguir massa muscular e que apela para esteróides – ganhando apenas os efeitos colaterais menos desejados no processo. E, por fim, Dwayne Johnson como um ex-presidiário que encontrou Deus e tenta se manter sóbrio. E, convenhamos, Wahlberg e Johnson fazem a melhor combinação de músculos e carisma de Hollywood.

Falem o que quiserem de Michael Bay. A maior parte das críticas negativas têm sua razão e ser – e já chegamos lá. Mas se tem um diretor que faz valer cada frame da película é ele. Cada enquadramento, cada giro de câmera (que são até bem poucos para o padrão dele), cada plano é simplesmente o melhor do ponto de vista estético. Até a palestra motivacional ganha ares épicos quando filmada por ele. Quem dirá toda a trama cheia de pequenas e grandes reviravoltas, perseguições e paranoia induzida por cocaína ou shake de proteínas.

O que não chega a salvar o filme, de forma alguma. O didatismo de Bay é irritante demais. Do início ao fim somos bombardeados com falas em off dos personagens. De todos eles. Seja o trio central, seja o ex-policial vivido por Ed Harris ou o vingativo extorquido interpretado por Tony Shalhoub. Ou ouvimos algo que apenas repete o que está em cena, ou algo irrelevante. O mesmo vale para as insistentes legendas, que almejam um fim narrativo-estilístico, mas não passam de poluição visual.

Publicado originalmente no Portal POP.

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Luiz Gustavo Vilela

Luiz Gustavo Vilela é jornalista formado pela PUC-Minas, especialista em Comunicação e Cultura pela UTFPR, mestre e doutorando em Comunicação e Linguagens pela UTP. Entre 2011 e 2015 foi crítico de cinema no Portal POP.

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