“Tomorrowland: Um Lugar Onde Nada é Impossível”

Não é difícil entender porque “Tomorrowland” não foi bem nas bilheterias americanas, tendo recuperado pouco mais de um terço de seu orçamento inicial (de US$ 190 milhões). É um filme que aponta o dedo à nossa cara e diz como nosso consumo exagerado está causando a ruína do planeta. E que não apenas somos alertados, como transformamos esses alertas em piada ou em outros ativos de consumo. Que não estamos interessados em nenhuma solução que envolva algum tipo de mobilização.

Esta não é a grande metáfora do filme. Pelo contrário. Um dos personagens, já próximo do fim do filme, olha para a câmera e diz exatamente isso. Com todas as letras. E ninguém gosta de saber que é responsável pelo fim do mundo, especialmente em uma sociedade tão individualista como a nossa. A parte curiosa é que a baixa bilheteria meio que prova o ponto do discurso do filme. Não estamos mesmo interessados em uma solução que envolva mobilização. Só queremos que alguém resolva os problemas para a gente. Da mesma forma como queremos ver filmes em que os problemas se resolvam.

Ainda assim, “Tomorrowland” sabe que esse é o tipo de mensagem que precisa estar embalada em um pacote bonito. Tanto é que as primeiras cenas mostram os dois protagonistas, Frank Walker e Casey Newton, interpretados por George Clooney e Britt Robertson, discutindo qual é a melhor forma de contar essa história. Por onde começar e como seguir em frente. Ao mesmo tempo, é uma chance de fazer o filme começar duas vezes, cada vez com um dos dois personagens, sem quebrar a narrativa, aproveitando ainda para mostrar a diferença brutal entre os dois personagens, questão que será central para a trama.

O que faz a história andar é o sonho de Casey de ir para a tal Tomorrowland, uma espécie de realidade paralela em que se reúnem as maiores e mais criativas mentes do mundo. Eles ficam lá desenvolvendo tecnologias para melhorar a vida das pessoas. É esse sonho, induzido pela misteriosa Athena, papel da adorável Raffey Cassidy, que coloca a jovem Casey em contato com Frank e seu relógio com uma contagem regressiva para o fim do mundo.

A relação conflituosa entre o rabugento Frank e a animada Casey é que dá o tom daí em diante, junto às cenas de perseguição mundo afora que culminam em uma sequência bem impressionante em Paris, logo antes de eles conseguirem chegar a Tomorrowland. Ela é a encarnação da esperança e do otimismo, enquanto todo o resto do mundo está basicamente dividido entre os que fingem não saber que o fim está próximo e os que sabem e passam o tempo gritando com aqueles em vez de tentar fazer algo.

Já Casey faz, o que fica claro já em sua primeira aparição no filme, sabotando a plataforma de lançamento da Nasa para evitar seu desmonte e a consequente dispensa do pai. Como Athena diz, quando precisa explicar a diferença entre ela e todas as outras recrutas, Casey não desiste. Daí parte do conflito com Frank, já conformado com o fim do mundo, em relação ao otimismo dela.

Daí também surge o conflito dela com Nix, papel de Hugh Laurie, o antagonista do filme. Ele é um tecnocrata que nunca acreditou no poder da imaginação e já não tem fé na humanidade. Ao mesmo tempo ele representa a permanência de ideias datadas, permanecendo à frente de Tomorrowland sem nunca envelhecer, não permitindo a entrada de novas gerações, perpetuando um pessimismo que contamina o mundo.

Brad Bird, o diretor, fez um trabalho delicado, colocando toda essa relação de sentido como parte da narrativa, que é intercalada com bastante elegância com as sequências de ação. O resultado é um filme que talvez melhore com o tempo e ganhe uma legião de fãs se tornando um clássico cult de alguma forma. Aí, quem sabe, aos poucos, sua mensagem seja apreendida de alguma forma.

Publicado originalmente no Portal POP.

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Luiz Gustavo Vilela

Luiz Gustavo Vilela é jornalista formado pela PUC-Minas, especialista em Comunicação e Cultura pela UTFPR, mestre e doutorando em Comunicação e Linguagens pela UTP. Entre 2011 e 2015 foi crítico de cinema no Portal POP.

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