“Vizinhos Imediatos de 3.° Grau” não se decide entre filme-família e a comédia escrachada

“Vizinhos Imediatos de 3.° Grau” não se decide entre filme-família e a comédia escrachada

Taí um filme que tinha tudo para dar certo. Um elenco com bons nomes da comédia americana, um diretor bem promissor e um argumento genérico, desenvolvido por bons roteiristas. Tudo essencial para esse tipo de filme. Mas o caldo desandou em algum ponto, entre o roteiro e a direção, que deixou a mistura um tanto indigesta.

O longa acompanha Evan, papel de Ben Stiller, um preocupado cidadão que adora o lugar em que vive. Mas quando um assasinato acontece, Evan decide que precisa assumir a responsabilidade e cria então um grupo de vigilância comunitária. Quem se alista é o pai de família falastrão Bob, papel de Vince Vaughn, o jovem militarista Franklin, feito por Jonah Hill, e o britânico Jamarcus, interpretado por Richard Ayoade. Mas logo nas primeiras rondas eles descobrem que algo sinistro e potencialmente alienígena está por trás dos incidentes.

O roteiro é dos atores e roteiristas Seth Rogen e Evan Goldberg, que já tinham entregue pequenas pérolas como “Superbad – É Hoje!”, ou “Segurando as Pontas”. E as marcas deles aparecem nos melhores momentos do filme, uma pena que sejam tão poucos. Porque só dá para pensar que o outro roteirista, Jared Stern, com “Os Pinguins do Papai” e “A Princesa e o Sapo” no currículo, tenha sido o responsável por transformar a maior parte da projeção em uma comédia família das mais tardes-de-semana-da-televisão-aberta.

Causa ainda mais estranhamento todo o discurso-família, que contrasta fortemente com os diálogos dos quatro atores centrais, altamente sexualizados e recheados de palavrões, pensar que o filme é dirigido por Akiva Shaffer. Isso porque ele veio diretamente do grupo de roteiristas e diretores do “Saturday Night Live”, ao lado do “Daily Show”, um dos programas mais engraçados, libertários e menos indicados para toda a família. Daí fica difícil entender onde se encaixa nisso o papel do pai preocupado com o namorado da filha, ou a questão do casamento de Evan. Faz mais sentido o personagem de Franklyn, cuja família e históricos são mais muletas para piadas que relevantes dramática ou narrativamente.

Os atores são os que menos decepcionam, por ficarem tranquilos em suas áreas de conforto. Stiller vive o certinho que tem problemas para externar suas emoções, Vaughn é o falastrão incoveniente e Ayoade é britânico. Só Hill parece se distanciar um pouco do que faz, ao abraçar um personagem um pouco mais perturbado e militarista, rendendo alguns dos melhores momentos do filme.

Há ainda uma possibilidade de leitura que talvez, e só talvez, seja um pouco forçada da minha parte. Mas quando um filme já começa dizendo que ele vive no “melhor planeta, no melhor país, na melhor cidade, no melhor bairro”, fica difícil não pensar no quanto o discurso é exageradamente patriótico. Além disso, os “aliens” (palavra que tem conotação de estrangeiro) se comportam de forma a querer destruir valores tipicamente americanos, como a família e a propriedade.

A impressão é reforçada quando se descobre que os aliens estão disfarçados de humanos, gerando aquela paranoia típica dos tempos da Guerra Fria. Ou, pior, quando um deles resolve justificar suas ações ao dizer: “nós chegamos, destruímos tudo e partimos para o próximo planeta. É isso que aliens fazem”. O discurso xenófobo em subtexto aparece ainda mais reforçado quando a “solução” para o problema é que eles se armem até os dentes e tratem de dar um jeito nesses invasores sem moral.

Mas, de novo, pode ser que eu esteja forçando a barra.

Publicado originalmente no Portal POP.

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Luiz Gustavo Vilela

Luiz Gustavo Vilela é jornalista formado pela PUC-Minas, especialista em Comunicação e Cultura pela UTFPR, mestre e doutorando em Comunicação e Linguagens pela UTP. Entre 2011 e 2015 foi crítico de cinema no Portal POP.

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