Decepção e amadurecimento são temas de “Amor Bandido”

Filmes de amadurecimento já são considerados um gênero à parte em Hollywood. E dá para entender o apelo, considerando o quanto a cultura deles – e a nossa por osmose – é voltada para a adolescência, momento em que, supostamente, mais amadurecemos efetivamente. Mas, vira e mexe, aparecem alguns filmes que se sobressaem. Às vezes por perverter a fórmula. Às vezes por abraçá-la e mostrar novos aspectos, ainda enexplorados. “Amor Bandido” é do segundo tipo. Com louvor.

Acompanhamos aqui Ellis e Neckbone, papéis de Ty Sheridan e Jacob Lofland. Dois amigos inseparáveis que dividem seu tempo entre ajudar suas famílias e explorar os rios e ilhas do Arkansas. São jovens. Muito jovens. Mas já endurecidos – e é impressionante como isso aparece em seus olhares. Um dia, em uma ilha mais afastada, onde eles nem deveriam estar, para começo de conversa, eles acabam encontrando Mud, intepretado por Matthew McConaughey, que logo descobrem ser um fugitivo da lei por ter matado um homem.

Mas, e sempre há um mas, Mud matou alguém que estava fazendo mal a sua eterna amada, Juniper, vivida por Reese Witherspoon. E a história cativa os garotos, especialmente Ellis, que resolvem ajudá-lo. O que se segue é uma versão moderna e mais visceral de “Conta Comigo” (o filme dos garotos que partem em uma missão para encontrar um corpo), com Mud servindo de figura paterna para os dois, que, por sua vez, se tornam os olhos e braços do fugitivo na cidade.

O filme se alterna entre os encontros dos garotos com Mud e o dia a dia dos dois quando estão longe, não apenas em `missão` para o fugitivo. E a sensibilidade ímpar do filme está em mostrar como um momento influencia o outro. Se Ellis tenta algo com uma menina, por quem se apaixona, por exemplo, é por acreditar no amor de Mud e Juniper. É o amor que ele já não mais vê em sua casa, ou ainda, talvez jamais tenha visto de verdade. E é daí que vem a sua decepção e raiva profunda.

Todo o filme é uma coleção de momentos assim, que se alternam entre o delicado e o catártico. Embalado pela bela fotografia, que ressalta paisagens pouco conhecidas do centro dos EUA – tão rurais e embrutecidos quanto o nosso interior. O diretor, Jeff Nichols, soube perfeitamente como usar a ambientação em favor da narrativa. Esse tipo de criança, nesse tipo de situação, são perfeitamente possíveis lá. São versões modernas de Tom Sawyer e Huckleberry Finn, criados por Mark Twain para a literatura.

Mas, por mais talento bruto que uma criança tenha, seus méritos são sempre mais do diretor, que soube conduzi-las para onde ele quer. Nesse sentido, quem se destaca é McConaughey, que faz seu tipo galã de comédias românticas e fábulas aventurescas desaparecer dentro de Mud. A boca torta, o sotaque caipira, as fabulações, tudo faz parte de uma grande construção de personagem. E, considerando o trabalho do ator em filmes recentes como “O Poder e a Lei”, “Obsessão” e o vindouro “Dallas Buyers Club”. A impressão é que ele já tem dinheiro o suficiente e pode se dedicar a trabalhos sérios. Bom para o público exigente.

Publicado originalmente no Portal POP.

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Luiz Gustavo Vilela

Luiz Gustavo Vilela é jornalista formado pela PUC-Minas, especialista em Comunicação e Cultura pela UTFPR, mestre e doutorando em Comunicação e Linguagens pela UTP. Entre 2011 e 2015 foi crítico de cinema no Portal POP.

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