Quando retomamos o contato com nosso grupo de heróis favorito, eles estão no que deveria ser sua missão final: desmantelar a última grande base da H.I.D.R.A. e finalmente recuperar o cetro usado por Loki em “Os Vingadores”. A abertura já cheia de ação tem uma função tripla na trama. Nos situar em relação à história, já que há um salto temporal considerável entre o fim dos últimos filmes-solo do Homem de Ferro, Thor e Capitão América; nos empolgar, deixando bem claro que este é um filme com bastante adrenalina; e deixar bem claro o nível de entrosamento da equipe em ação, já que a função de “Era de Ultron” é acabar com isso.
“Vingadores: Era de Ultron”, cuja crítica completa do Além do Oscar pode ser lida aqui, leva a metáfora que correlaciona a Batalha de Nova York de “Os Vingadores” com o 11/09 adiante. O foco da ação é quase todo fora dos EUA e a equipe é indesejada, especialmente na fictícia Sokovia, o país natal dos gêmeos Wanda e Pietro Maximoff que possuem poderes gerados pela H.I.D.R.A. com base em experimentos com o bastão de Loki. A equipe americana, reagindo depois de ser atacada, é considerada invasora, assim como a intervenção americana no Oriente Médio depois do ataque às Torres Gêmeas.
Ultron, por isso, é um símbolo anti-americano profundo, já que ele se auto-replica buscando a homogeneidade. Os Vingadores, por outro lado, simbolizam a diferenciação humana, já que cada um possui uma habilidade que o torna único. Os heróis são o que, no pensamento do vilão, o que há de pior com a humanidade e, por isso, devem ser destruídos primeiro. Não há espaço para nossas falhas no mundo coeso que ele procura criar. Para isso o grupo precisa lutar entre si, se tornando ocupado e desarticulado demais para dar conta da ameaça.
Na prática, Ultron, o grande inimigo do filme, nasce da colisão entre a tecnologia de Tony Stark e as experiências com o cetro, que se revela algo bem mais poderoso do que o primeiro “Os Vingadores” deixou antever. Mas a parte importante é o que ele significa dentro da trama, já que ele é a personificação da paranoia de Stark pós Batalha de Nova York, fruto de uma tentativa frustrada de tentar evitar uma futura invasão. É o tipo de ação que deixa o Capitão América de cabelo em pé por ser arbitrária e autoritária. Não custa lembrar que ele nem piscou para derrubar a S.H.I.E.L.D. em “O Soldado Invernal” por esse mesmo motivo. Está plantado, muito espertamente, o germe da cissão de “Guerra Civil”, o próximo filme da Marvel depois de “Homem-Formiga”.
Todas essas metáforas sócio-políticas são bastante discretas e aparecem soterradas por baixo de cenas de ação mais e mais empolgantes alternadas com melodrama que parece um pouco descolado. Joss Whedon se ocupa de explorar as relações (até então inexistentes) entre Natasha Romanoff e Bruce Banner ou de criar todo um passado e contexto para o Gavião Arqueiro ao invés de ampliar a tensão dramática das visões de cada um dos personagens depois de terem sido hipnotizados por Wanda. Especialmente as da Viúva Negra, de profundo caráter dramático, e do Thor, com maiores impactos em relação aos futuros filmes, já que é a primeira vez que vemos os artefatos das outras histórias (o bastão de Loki, o Éter, o Tesseract e o Orbe) como as Joias do Infinito cobiçadas por Thanos, o vilão que está orquestrando tudo por trás dos panos.
Mas se o drama não funciona muito bem para os personagens, para a equipe como um todo é bem afiado. Afinal, assim como no primeiro filme, são os Vingadores, como um todo, que passam pela transformação que cada história pede que seu personagem passe. Se em “Os Vingadores” descobrimos como esses indivíduos se tornam uma equipe, agora aprendemos como esse grupo precisa encontrar maneiras de se reinventar e se adaptar se quiser continuar relevante. E isso, para quem conhece os quadrinhos, é muito mais do que simplesmente ter a liberdade de tirar e colocar personagens dependendo de como os contratos dos atores forem acertados.
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Publicado originalmente no Portal POP.