“Game of Thrones” S05E09 – “The Dance of Dragons”

É possível apontar três grandes motivos para a sensação de decepção que deve estar com a maior parte das pessoas depois do último capítulo de “Game of Thrones”. O primeiro deles é, claro, a tradição de que o nono episódio trará o grande ápice da temporada (e este ter sido batizado de “A Dança dos Dragões” aumentou muito a expectativa). A morte de Ned Stark, a batalha de BlackWater, o Casamento Vermelho e a Batalha na Muralha marcaram os momentos mais memoráveis da série, coisa que não se repete pela quinta vez.

A outra questão é o primeiro grande confronto entre os homens e os White Walkers, que marcou o final do oitavo episódio, “Hardhome”. O impacto da batalha, mais a elegância com que foi filmada, garantiu seu posto de ponto alto da temporada, deixando este nono capítulo ainda mais anti-climático. Não ajudou, por fim, que a morte não tivesse sido uma grande surpresa, com boa parte do arco narrativo de Stannis Baratheon tendo sido dedicado para construir o drama de sua escolha, mesmo que a cena tenha sido de partir o coração.

Ainda assim, há uma consonância temática em todo o episódio, que merece um olhar um pouco mais aprofundado. Assim que chega a Castle Black depois da batalha de Hardhome, Jon Snow ouve o seguinte de Ser Alliser Thorne, seu maior antagonista: “Você tem um bom coração, que levará todos nós à morte”. É o anúncio de que os personagens precisam endurecer seus corações, sacrificar toda a inocência em nome do que acreditam ser um bem maior. É, afinal, a escolha de Stannis, que leva à chocante cena, cujas consequências estarão no fim deste episódio.

A escolha de Arya, ainda em treinamento, com uma missão a ser cumprida, também passa pela questão do que resta de sua própria inocência. Tanto ao abrir mão de sua tarefa ao se deparar com Ser Meryn Trant, um dos nomes de sua lista, quanto pela forma que ela parece ter encontrado para cometer o assassinato. O alvo, afinal, tem séria tendência à pedofilia, o que é quase bom demais para ser verdade para a jovem Stark, mas também envolve um caminho perigoso.

Na sequência final de “The Dance of Dragons”, que realmente justifica o título do episódio, vemos Daenerys também seguir pelo caminho da perda da inocência em sua nova faceta como governante. Como conquistadora, ela já não tinha mais nenhuma pureza para sacrificar, mas pensava que, uma vez no trono, poderia ser mais justa. Daí a decisão de reabrir as arenas de luta, tentando criar um laço entre ex-senhores e ex-escravos, marginalizados em posições sociais opostas, impossíveis de serem dissolvidas por um decreto de uma nova rainha.

As arenas simbolizam, para Daenerys, a celebração da morte como esporte, o que é completamente diferente de uma guerra, em que se morre por um ideal. Logo fica claro que a reabertura das arenas de luta não apenas em nada contribuíram para para a paz de Meereen, como também criaram uma perfeita oportunidade de ataque para os Filhos da Harpia, que atacam sem misericórdia. Ao confiar em seus instintos, pela primeira vez em toda temporada, a rainha recupera a confiança de seu filho rebelde, que aparece para lhe salvar.

É a inocência cega de Daenerys, que confia que Drogo, seu dragão, não irá lhe machucar, que guarda a sua salvação. Mais ou menos como Jon Snow e seu bom coração, o que reforça a polaridade extrema entre os dois personagens, gelo e fogo, em toda a série. Saímos dos dramas shakespearianos, com suas armações e mortes por poder, e entramos no terreno de Nelson Rodrigues, onde há apenas redenção para os puros. Mesmo as noções de pureza deturpadas de “Game of Thrones”.

Publicado originalmente no Portal POP.

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Luiz Gustavo Vilela

Luiz Gustavo Vilela é jornalista formado pela PUC-Minas, especialista em Comunicação e Cultura pela UTFPR, mestre e doutorando em Comunicação e Linguagens pela UTP. Entre 2011 e 2015 foi crítico de cinema no Portal POP.

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