“O Exterminador do Futuro: Gênesis” dá frescor para uma franquia desgastada

Há uma elegância ímpar na forma como o roteiro deste “O Exterminador do Futuro” se articula para conseguir retificar toda a franquia que havia perdido o sentido por conta dos outros filmes e suas intervenções na linha do tempo. As opções narrativas são justificadas de forma relativamente sólida, dando um novo fôlego para uma trama que sofreu nas mãos de realizadores menos competentes.

O primeiro acerto de “Gênesis” está em sua ambição, portanto. Alan Taylor, o diretor, não está interessado em contar mais um capítulo da saga da família Connor, mas sim em resetar toda a franquia para, só então, poder seguir em frente. É por isso que, quando Kyle Reese (Jai Courtney) chega ao meticulosamente recriado ano de 1984, é Sarah Connor (Emilia Clarke) quem o salva, como vimos nos trailers. Descobrimos, em seguida, que John Connor (Jason Clarke), de alguma forma foi cooptado pela Skynet e vai encarar seus pais como o grande vilão da trama. Tudo faz parte do plano.

Essa nova dinâmica é interessante por diversos fatores. Com Sarah tendo sido atacada na infância e crescendo sob a tutela de um exterminador, apelidado de Pops (Arnold Schwarzenegger), programado para lhe proteger, ela acaba sendo alçada ao papel de grande heroína do filme. Isso é importante para não devolvê-la ao status de dama em perigo do primeiro filme, revogado para o segundo, em que a personagem já aparecia preparada para uma boa briga. Ao mesmo tempo, isso a coloca em pé de igualdade com Reese.

É essa a dinâmica que está no coração emocional de “O Exterminador do Futuro: Gênesis”. O exterminador se torna claramente uma espécie de figura paternal para Sarah, que sabe que irá em algum momento se apaixonar por Reese, mas se sente frustrada por se sentir sem controle de seu próprio destino. Ao mesmo tempo, Reese não consegue confiar em Pops, uma máquina que ele mesmo foi “programado” para odiar ao longo de toda a sua vida. O resultado é uma estranha dinâmica de genro e sogro, em que Taylor explora a falta de expressão de Schwarzenegger como o robô que estaria ranzinza em relação ao jovem cortejando sua filha.

Por isso, para Sarah, é ainda mais frustrante não conseguir se conectar com John. Se, de alguma forma, ela consegue ter uma conexão com Pops, uma máquina, ela deveria poder fazer o mesmo com seu filho, mesmo depois de ele ter ido para o outro lado. Essa é uma questão pouco explorada no longa, mas que está lá, no meio das viagens temporais e cenas de ação desenfreadas. Todas, inclusive, muito bem executadas, deixando pouco espaço para o fôlego.

O Gênesis, do título, se refere a um sistema operacional que irá afetar todos os aparelhos ligados à internet. Assim como os primeiros filmes capitalizaram nosso medo de que um dia nos tornaremos obsoletos, “O Exterminador do Futuro: Gênesis” explora (superficialmente) a onipresença de aparelhos móveis e a nossa entrega deliberada de informações para as corporações. O que é também a grande contribuição de John Connor para a própria Skynet, em uma reversão narrativa que é bastante interessante.

Afinal, se Connor mandou seu melhor amigo para proteger sua mãe no passado, garantindo sua própria existência e assim uma chance de vitória da humanidade contra as máquinas, a Skynet faz o mesmo, mandando o próprio Connor para o passado para que ele possa criar tanto a tecnologia de viagem no tempo quanto a própria inteligência artificial total que tornaria os humanos obsoletos. Viu como é simples?

Na verdade, nada é simples quando o assunto é ficção científica. O que leva a uma série de furos de roteiro que ganharão vida nas redes sociais depois da estreia de “O Exterminador do Futuro: Gênesis”. Alguns deles são varridos para baixo do tapete, como quando John diz que pode matar seus pais porque acredita estar vivendo fora do nexus temporal, em uma afirmação que faria Einstein revirar-se no túmulo. Outros, inclusive, deverão se tornar pivotais nos possíveis próximos filmes (dependendo da bilheteria), como por exemplo, quem diabos mandou Pops para o passado para proteger Sarah?

Talvez, no meio disso tudo, Taylor tenha apenas nos bombardeado com uma grande cena de ação toda vez que o enredo ficou complicado demais. Coisa que apenas o teste do tempo irá averiguar. Mas agora, ainda no calor do impacto visual deslumbrante, das grandes atuações, especialmente as de Emilia e Jason, das sequências alucinantes, “Gênesis” parece quase tão interessante quanto os dois primeiros filmes da franquia. Resta saber se também entrará para a história como eles.

Publicado originalmente no Portal POP.

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Luiz Gustavo Vilela

Luiz Gustavo Vilela é jornalista formado pela PUC-Minas, especialista em Comunicação e Cultura pela UTFPR, mestre e doutorando em Comunicação e Linguagens pela UTP. Entre 2011 e 2015 foi crítico de cinema no Portal POP.

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