“Tudo por Justiça” examina seus personagens em momento extremo

Tudo Por Justiça

A sinopse divulgada de “Tudo por Justiça” é algo assim: um ex-presidiário, vivido por Christian Bale, que só quer tocar sua vida, acaba envolvido em uma trama de vingança quando um criminoso interpretado por Woody Harelsson mata seu irmão mais novo, papel de Casey Affleck. Não há nada de errado com ela. Todos esses elementos estão no filme. Mas é impressionante o quão pouco representativo do que o filme mostra.

Isso porque o diretor, Scoot Cooper, usa toda a sua calma para estabelecer esse universo. Aos poucos vamos conhecendo Russell Blase, papel de Bale, um operário que é casado com Lena, vivida por Zoe Saldana. Ele não é rico, mas tenta ajudar seu irmão, que, em parte por conta dos traumas da guerra do Iraque, tem dificuldade de se ajustar. Ele se divide entre esses vários problemas até que um acidente o joga na cadeia. Quando sai, um novo mundo o aguarda. E, logo, a tragédia, que é do que esse filme trata, afinal.

Todo esse tempo é necessário para ir tirando de Russell as coisas que ele mais ama e chegar no ponto em que ele já não tem mais nada a perder. É aí que ele está pronto para partir em busca de um misto justiça – daquele tipo que nada tem haver com leis – com vingança. E não há satisfação. É, simplesmente, algo que ele sente que precisa fazer. Senão ninguém mais fará. Não é coincidência que isso acabe fazendo um comentário sobre o atual momento social brasileiro, com justiceiros nas ruas, querendo tomar o lugar do estado que é ineficiente. E é difícil não simpatizar com a causa.

Impressiona muito como a maior parte dos diálogos não dizem nada sobre o que está acontecendo em cena. A maior parte deles, inclusive, é bem banal. Mas há uma profunda tensão que preenche esses espaços, deixando claro que o artifício é mais do que a manipulação do silêncio – o que já seria um grande feito. E quando não há mais lugar para estocar, a coisa explode. É só então que os personagens falam verdadeiramente sobre o que estão sentido, valorizando a catarse emocional.

Para conseguir esse efeito, o diretor Scott Cooper precisou de um elenco acima da média. Nesse sentido, se Bale é a espinha dorsal, encarnando o caos calmo que é a existência de seu personagem, os demais atores trabalham como desdobramentos disso. Tanto os já citados Affleck e Harrelsson, quanto, claro, Willem Dafoe. E é provável que nenhum outro ator conseguisse criar um agiota de bom coração e ainda fazê-lo ficar convincente.

O resultado é um filme árido. Sem fazer concessões de alívios cômicos ou redenções fáceis. O objetivo é outro. O que Cooper quer é colocar seus personagens em cheque. O que ele alcança, com isso, é um retrato que mostra o demônio que existe em cada um de nós, que está apenas esperando um momento para sair da garrafa.

Publicado originalmente no Portal POP.

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Luiz Gustavo Vilela

Luiz Gustavo Vilela é jornalista formado pela PUC-Minas, especialista em Comunicação e Cultura pela UTFPR, mestre e doutorando em Comunicação e Linguagens pela UTP. Entre 2011 e 2015 foi crítico de cinema no Portal POP.

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