Ao contrário do que aconteceu nas outras nove críticas da quinta temporada de “Game of Thrones”, esta possui inevitáveis spoilers.
No quinto episódio desta quinta temporada de “Game of Thrones”, Mestre Aemon pediu que Jon Snow “matasse a criança”, para deixar o adulto assumir. É o conselho que leva o recém-empossado Lorde Comandante da Patrulha da Noite a seguir para Hardhome e tentar salvar o Povo Livre acima da muralha. Mas este conselho acaba se revelando uma profecia neste impressionante último episódio, em que ele recebe o tratamento de Júlio César, com direito a um olhar que significa: “Até tu, Brutus?!”.
A morte de Jon Snow é a manifestação visual mais radical do que é o maior postulado dessa temporada: a morte da inocência, deflagrada, talvez, por Tyrion Lannister, ao assassinar seu próprio pai. Tudo o que aconteceu depois disso, com a maioria dos personagens centrais, envolveu o processo de lhes retirar completamente qualquer ingenuidade em relação a si mesmos ou ao mundo que lhes resta. Apesar de Jon Snow ter fechado o episódio, nenhum arco foi tão brutal quanto o de Cersei Lannister.
O luto por ter perdido o filho mais velho e o pai, suas duas grandes referências e protetores, além da sanha de vingança dirigida a Tyrion, coroados por sua sede de poder, lhe fizeram dar amplos poderes para a Fé Militante, pensando neles como uma forma de tirar seus inimigos do caminho. Até que ela mesma se tornou alvo do fanatismo religioso, levando ao grande momento da temporada: a caminhada da vergonha de Cersei rumo ao Castelo Vermelho, completamente nua, de cabelos raspados e sendo xingada e cuspida, qual Geni do nosso Chico Buarque.
A cena é dura, mesmo para uma personagem tão odiosa quanto Cersei. E é mais um grande momento de Lena Headey como atriz, conseguindo deixar claro quão humilhada está se sentindo, ao mesmo tempo em que parece planejar, ali mesmo, durante a caminhada, sua vingança. A impressão que temos por essa cena é que ela vai simplesmente abandonar os artifícios políticos, para os quais não possui habilidade alguma, e partir para o punho de ferro violento e cruel. Nesse sentido, vai ser bem interessante acompanhar o trabalho de Tyrion em Meereen, que contará com sua administração na ausência de Daenerys, ocupada nas mãos de uma nova tribo Dothraki.
A caminhada da vergonha de Cersei é o ponto alto de um capítulo sem pontos baixos. O que é particularmente cruel, quando lembramos quanto tempo foi perdido nos primeiros episódios desta temporada, que ficaram ocupados em rearranjar os jogadores no tabuleiro, gerando arcos sensivelmente mais mornos.
Teremos adiante um ano para discutir sem parar porque Arya ficou cega depois de matar um homem de sua lista ao invés do encarregado pelo Deus das Muitas Faces. Ou para especular sobre como Cersei irá receber, depois de tudo o que sofreu, a morte de Myrcella (parte da misericórdia da mãe, do título original, parece passar por aí), e o impacto disso nas relações com Dorne. Ou ainda sobre o destino de Sansa e um Theon em busca de redenção. E, claro, como a Patrulha da Noite irá lidar tanto com a questão do Povo Livre, agora ao sul da Muralha, quanto com os White Walkers que se aproximam. Com Bran Stark, agora controlando seus poderes, voltando a ser um elemento no Jogo dos Tronos.
A morte de Jon Snow, por fim, volta a nos lembrar que esta não é uma série feita de certezas escritas em pedra. Especulamos bastante, ao longo das últimas semanas, sobre como a hereditariedade dele poderia influenciar no arranjo de poder de Westeros. Mas isso pouco importa. Ou não?
Antes da cena em que o jovem Lorde Comandante é traído, acontecem duas coisas em que vale a pena prestar atenção. Uma é o retorno da Montanha, ainda mais monstruoso, provando que mortes já não são mais definitivas em “Game of Thrones”. A outra é a entrada de Lady Melisandre em Castle Black, o que pode implicar na sobrevivência de Jon Snow. Sendo esse, claro, um dos tópicos que passaremos o próximo ano discutindo sem parar.
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Publicada originalmente no Portal POP.