É um filme do Terrence Malick, afinal. Isso implica em algumas certezas. A primeira é que há algo a ser dito. Uma tese, que será exposta e defendida enquanto assistimos. A segunda, e talvez mais importante, é que não vai ser fácil extrair isso do filme enquanto acompanhamos diálogos interiores em off e os personagens andando a esmo pelos ambientes.
A trama é mais do que simples. Neil, interpretado por Ben Affleck, se apaixona por Marina, papel de Olga Kurylenko, na França. O amor é tão fulminante que eles resolvem se mudar para os EUA, junto da filha dela. A situação se torna, logo, insustentável, e eles se separam, deixando espaço para que ele se envolva com Jane, vivida por Rachel McAdams. Tudo isso entremeado com a crise de fé do Padre Quintana, defendido por Javier Barden.
Não é muito difícil de entender que Malick está falando sobre amor. Ao mesmo tempo em que mostra as diferentes relações entre Neil e as duas mulheres, ou mesmo ele com a pequena Tatiana, mostra a relação de Quintana e a comunidade e, em última instância, com Deus. São todos diferentes tipos de amor, que podem nos levar tanto ao êxtase quanto ao horror e desespero. E no universo de Malick, não há meio termo.
Para o diretor, a existência é um mistério, ainda que glorioso. Não temos pistas reais de nada. Por isso todos os personagens caminham o tempo todo. Em torno de si em momentos mais amenos, em sentidos diferentes ou contrários quando a coisa não vai bem. Procuramos algo que nem sabemos o que é. Procuramos em nós mesmos, nos outros ou nos castelos que de coisas que erguemos à nossa volta.
O amor não é só uma questão física, mais no sentido de localização espacial do que carnal da coisa. Malick também mostra que o amor é um problema de comunicação. Por isso, ainda que todos falem inglês, eles não falam em inglês o tempo todo. A aproximação com a Babel bíblica é óbvia. Nem todo amor do mundo florece quando não conseguimos nos entender plenamente. E o mesmo vale para Deus. Não é culpa d`Ele se não somos sensíveis (alfabetizados?) para ouví-Lo.
Em “A Árvore da Vida” Malick já tinha relacionado a manifestação de Deus na natureza. Aqui não é diferente. O trabalho de Neil o coloca em áreas de risco de contaminação por conta de mineração. Jane trabalha em uma fazenda, Marina é absolutamente urbana. Todas essas ambientações mostram o quanto eles estão mais próximos ou distantes de um ideal de amor.
Malick foge de todas as convenções cinematográficas, como é comum em sua cinematografia. Não há uma introdução, clímax ou anticlímax, catarse ou desfecho. A câmera passeia pelos belos cenários como se, também ela, estivesse tão perdida quanto os personagens. É como se, às vezes, ela nem ao menos soubesse o que ela quer enquadrar, cortando cabeças ou pés – mas nunca a ação.
Tudo, claro, intencional. Mesmo este sendo o menor intervalo entre filmes da carreira de Malick (apenas um ano entre este e “A Árvore da Vida”), toda a sua meticulosidade está escancarada em cada frame. Seja nos enquadramentos, seja na fotografia, que possuem uma beleza estética que é de tirar o fôlego.
O que, claro, não faz com que o filme seja mais fácil de ser assistido.
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Publicado originalmente no Portal POP.