Mistaken for Strangers

Tom e Matt Berninger em MIstaken for Strangers

Matt Berninger achou que era uma boa ideia chamar seu irmão, Tom, para ajudar na turnê de sua banda, o The National. Como os outros músicos também são irmãos, há coerência. Como Tom tem algumas aspirações artísticas, ainda que voltadas para a produção audiovisual, ele inclui em sua bagagem uma câmera, com a ideia de documentar os bastidores dos shows. Mas o que começa como o mote de um típico documentário rock se transforma em outra coisa.

Tudo faz sentido. O The National é uma banda que vem em uma crescente incrível desde de seu penúltimo disco, o High Violet, que é o motivo da longa turnê mostrada no filme, inclusive. Então um documentário rock só viria a coroar essa boa fase. Mas a obsessão de Tom consigo mesmo e seu senso de derrota fazem com que Mistaken for Strangers seja muito mais um filme sobre como ele passou a vida na sombra do irmão e como isso o afeta profundamente do que o relato sobre o universo criativo da música independente e suas pretensões. Mesmo que isso esteja presente de alguma forma.

Mas o brilho de Mistaken for Strangers está em esconder de si mesmo o seu tema. Tanto Tom quanto nós mesmos queremos acreditar que estamos vendo cenas curiosas sobre os bastidores da turnê do The National. Mas rapidamente, na medida em que Tom falha mais e mais na sua função de assessorar a banda em suas pequenas demandas, o foco vai deixando de ser no The National e se tornando ele mesmo. E de si, passa para sua frustração em relação ao sucesso do irmão.

Todo esse processo é, no mínimo, hilário. O jeito gordinho, bêbado e atrapalhado de Tom, além de seus atos de auto-sabotagem, estabelecem o clima cômico que esconde um pouco a carga dramática, aumentar um pouco sua força no clímax. Ao mesmo tempo, serve de contraste profundo em relação a Matt – magro, cerebral e auto-centrado. Fora, claro, a relação entre sucesso e fracasso. Mas logo Tom praticamente larga suas obrigações com a turnê para mergulhar mais e mais no mito de seu próprio irmão.

Há uma redenção, como toda narrativa dramática que se preze. E ela vem quando Tom (e nós também) consegue enxergar Matt como um ser humano, como uma mistura de defeitos e qualidades únicas. O irmão, líder de uma grande banda que está estourando mundialmente, se abre. E ele não apenas fala de seus medos, suas fragilidades, seus temores e até mesmo de seu pior momento enquanto músico. Matt fala de como usou tudo isso para criar suas músicas, que é a raiz do sucesso do The National.

Mistaken for Strangers conta uma história de um perdedor que usou seu pior momento para criar uma bela obra, inspirado por um perdedor que usou seu pior momento na hora de compor músicas. A sensível metalinguagem do trabalho acaba fazendo jus ao The National de uma forma mais bela e profunda que um relato impessoal sobre os bastidores da turnê jamais conseguiria.

E a melhor parte é que apesar de não ser um documentário rock em seu sentido mais profundo, Mistaken for Stranges tem boa parte de suas imagens tiradas da turnê do The National, bem como da gravação do último disco, o Trouble Will Find Me. O que quer dizer que além de ser uma bela reflexão existencial sobre a natureza do sucesso e uma radiografia sobre as relações familiares dos Berningers, ele ainda cumpre a função de mostrar como é a banda em ação. Não dá para querer mais do que isso.

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Luiz Gustavo Vilela

Luiz Gustavo Vilela é jornalista formado pela PUC-Minas, especialista em Comunicação e Cultura pela UTFPR, mestre e doutorando em Comunicação e Linguagens pela UTP. Entre 2011 e 2015 foi crítico de cinema no Portal POP.

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