Tome como base as últimas adaptações de livros de John le Carré: Em 2001 foi O Alfaiate do Panamá, de John Boorman; em 2005, O Jardineiro Fiel, de Fernando Meirelles; e em 2011, O Espião Que Sabia Demais, de Tomas Alfredson. Por isso o anúncio de O Homem Mais Procurado gerou bastante expectativa, ainda que – veja bem – boa parte do exercício de crítica envolva suprimir a expectativa e a ansiedade antes de um filme. Adianto agora que esta nova versão para os cinemas está, pelo menos, na média de seus antecessores. O que, convenhamos, é mais do que muitos filmes conseguem chegar.
Na primeira cena vemos um homem chegar em Hamburgo por um dos canais do rio Elba. Ao acompanharmos seu esforço para subir as escadas rumo a terra firme o peso da trama fica estabelecido. Essa mesma pessoa, Issa Karpov (Grigoriy Dobrygin), um muçulmano sérvio fugindo das prisões russas, logo é identificado pelo serviço de inteligência chefiado por Günther Bachmann (Philip Seymour Hoffman). O imigrante logo fica sob suspeita de estar ali para contatar uma célula terrorista, e a equipe de espiões se torna responsável por monitorar possíveis extremistas e prevenir eventuais ataques, seguindo a paranoia pós 11/09.
Logo a trama se torna labiríntica, parecendo a mesma teia de relações da parede do escritório de Günther. Os diversos pontos envolvem outras divisões de espionagem e contra-espionagem, uma agente americana (Robin Wright), um banqueiro (Willem Dafoe), uma advogada de direitos humanos (Rachel McAdams) e um líder muçulmano (Homayoun Ershadi). No centro de tudo isso está Issa.
Pode parecer complicado, mas não é. Anton Corbijn nos conduz pela narrativa de forma eficiente, com graça, sem exagerar nos didatismos. Tudo engrandece a narrativa: a calma como estabelece a trama e os personagens, a paleta de cores azulada e o cuidado de evitar closes (que ajudam na sensação de que também estamos espionando). Além disso, fica claro o seu amadurecimento como diretor entre o já ótimo Um Homem Misterioso, de 2010, e O Homem Mais Procurado. A comparação cabe especialmente por ambos os trabalhos serem thrillers de espionagem.
As qualidades do trabalho ainda aumentam pelo tempo de cena dado para o finado – e já fazendo falta – Philip Seymour Hoffman. Seu Günther é a antítese do que se estabeleceu como espião no cinema: alcoólatra funcional (se é que isso existe), obeso e dono de uma voz rouca sofrida que parece fruto dos anos de fumo. Mesmo assim é impossível duvidar de sua capacidade de liderança, inteligência e convicção inabalável no que é certo e errado, mesmo que seja possível discordar do que isso significa em um mundo tão polarizado.
Seymour Hoffman é ainda melhor quando está ao lado de outros atores tão talentosos quanto ele. E O Homem Mais Procurado nos brinda com alguns momentos quase mágicos em relação às atuações. Seus diálogos com Dafoe, em que amedronta um poderoso banqueiro, com McAdams, que vão do paternal ao ameaçador em poucos segundos, e com Wright, em que encontra uma oponente à sua altura, já valeriam o filme, caso ele não tivesse tantas qualidades.
E é aí que chegamos ao final absolutamente devastador e de um pessimismo que vem se tornando mais e mais comum no cinema comercial dos últimos anos. Basta ver Planeta dos Macacos – O Confronto. Em O Homem Mais Procurado o fim sombrio parece apontar para algo além de um pós-clímax apocalíptico, como acontece no filme dos símios em que há um sentido mais narrativo do que metafórico (mesmo sendo uma escolha bem corajosa para um blockbuster). Há um comentário político que deixa claro que a guerra ao terror é sem sentido. Pior: é frustrante.
Quando se arrisca a fazer uma afirmação categórica é que O Homem Mais Procurado salta de thriller de espionagem genérico (ainda que muito bom) para filme necessário.