Busca Implacável 3

O ponto seminal da reinvenção da carreira de Liam Neeson como herói de ação tardio foi Busca Implacável. A produção de 2008 foi também uma grata surpresa na mesmice do cinema de ação, trazendo um pai, ex-operativo da CIA, que não media esforços para resgatar a filha sequestrada por um cartel de tráfico sexual na Europa. As muitas qualidades desse primeiro trabalho — o estilo de filmagem à la Trilogia Bourne, o roteiro relativamente bem amarrado, os diálogos tão bregas quanto saborosos e o peso de Neeson para o personagem — compensavam todas as fragilidades. Se a empolgação causada pelo primeiro filme ainda deu gás para segurar o segundo. Mas não este terceiro.

Tanto os roteiristas, Luc Besson e Robert Mark Kamen, quanto o diretor, Olivier Megaton, parecem ter falhado em identificar o que foi realmente interessante no filme original. Isto vale para a estrutura, já que os dois últimos filmes não mostram o Bryan Mills de Neeson em uma perseguição maluca deixando um rastro de destruição para trás, e também para as auto-referências, uma vez que que em nenhum dos dois somos recompensados com diálogos tão bons quanto o do primeiro e que tinham a função narrativa de estabelecer o personagem, — como quando o protagonista ameaça os traficantes dizendo ser um homem “com um grupo particular de habilidades”.

Ao contrário, o que tivemos foi Mills e sua ex-mulher, Lenore (Famke Janssen), sequestrados no segundo, com a filha Kim (Maggie Grace) tendo que os salvar, explodindo, claro, meia Istambul no processo. Enquanto neste Busca Implacável 3 temos o ex-agente acusado de um crime que não cometeu fugindo da polícia de Los Angeles e da máfia russa, tentando livrar o próprio nome. No processo ele toma uma série de decisões equivocadas — tão equivocadas que o policial Franck Dotzler (Forrest Whitaker) chega a lhe explicar como seria tudo mais simples se ele tivesse se entregado — que mal e mal levam a cenas de ação filmadas burocraticamente.

Tudo isso leva a uma quebra de ritmo na edição que torna o filme enfadonho. Um problema sério porque quando não conseguimos mergulhar na trama, os defeitos emergem de forma mais forte. Por isso fica tão absurdo ver que o roteiro dá para Mills poderes quase sobrenaturais, nem se preocupando em mostrar como ele escapa de algumas enrascadas, por exemplo. Ou soa tão estranho que um grupo de ex-operativos da CIA precise/ consiga manter uma casa segura no centro de Los Angeles. Nem a paranoia americana justificaria isso.

É claro que Busca Implacável 3 é um tipo de filme que vai apelar para o absurdo sem nem piscar. Mas, de novo, são os defeitos intrínsecos dele enquanto filme comercial que trazem à tona essas questões. É só notar como perdoamos facilmente o fato de Kim ter sido sequestrada junto de uma amiga no primeiro filme e Mills só resgatar a filha, deixando a outra para trás.  É um furo no roteiro que passa ao largo justamente porque estamos nos divertindo vendo Neeson aplicar golpes a torto e a direito. [Fui lembrado por colegas e por ouvintes do programa de rádio em que comento sobre cinema que Busca Implacável mostra o destino da menina sim. Mas sustento que o filme tem seus defeitos que importam pouco diante de suas qualidades]

É uma pena que a franquia Busca Implacável não tenha seguido a própria escola. Felizmente, outros diretores e roteiristas parecem aprender com isso. É o caso de De Volta ao Jogo, mais recente filme de ação com Keanu Reeves, que mostra um ex-assassino da máfia que parte em busca de vingança depois que roubam seu carro e matam seu cachorro, última lembrança da mulher pela qual ele havia largado essa vida. Piegas, divertido, descerebrado, com ótimas cenas de ação e uma edição mais do que esperta. Infelizmente, tudo o que Busca Implacável 3 não é.

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Luiz Gustavo Vilela

Luiz Gustavo Vilela é jornalista formado pela PUC-Minas, especialista em Comunicação e Cultura pela UTFPR, mestre e doutorando em Comunicação e Linguagens pela UTP. Entre 2011 e 2015 foi crítico de cinema no Portal POP.

2 de comentáriosDeixe um comentário

  • Eu até que estava gostando do filme, mas aí veio a previsível reviravolta no terceiro ato e fodeu tudo. Assim, mesmo com os absurdos e furos no roteiro, dava para passar batido, como aquele filme que você vai assistir numa 5ª feia a tarde e não tinha outras opções no multiplex, como foi o meu caso (até tinha, mas entre ver “Loucas para casar” e “Os Cara de pau”, prefiro ver o Lian Neeson, com “poderes quase sobrenaturais”, sentando a porrada nos bandidos); mesmo depois da ridícula cena de fuga no carro da polícia, ainda dava para engolir, mas juro que pensei que tinha cochilado quando a tal reviravolta acontece. Os russos estavam atrás de que? do Mills ou do vilão? Sabiam que algum deles ia passar naquele lugar àquela hora? Do nada o filme mudou de rumo. Daí para a frente o filme “degringola”.
    Luc Beson já foi um roteirista melhor, mas parece que hoje em dia ele só se concentra em escrever cenas de ação e não se preocupa com o que fica no meio dessas cenas. Coincidência ou não, aqui temos uma cena de fuga do mocinho onde ele provoca um acidente de trânsito colossal e pouco se preocupa se vai matar pessoas inocentes, assim como em “Lucy” e sua cena nas ruas de Paris.

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