“Clube de Compras Dallas” coloca opressor no lugar do oprimido

Clube de Compras Dallas

O que chama atenção para “Clube de Compras Dallas” é o definhamento físico de Matthew McConaughey e de Jared Leto como claro compromisso de ambos para com seus personagens e filme. Mas isso é espetáculo. A parte realmente importante da trama fala sobre preconceito. Sobre o nosso sempre irracional temor do desconhecido, do novo, do que simplesmente não faz sentido.

Por isso é que essa história é tão importante. Não é apenas para retratar a luta para viver de Ron Woodroof, diagnosticado com o vírus do HIV quando ainda não se sabia exatamente o que era isso. Nem mesmo sua batalha contra os laboratórios, interessados mais em lucros que em vidas, ou mesmo na experimentação de drogas que, bem ou mal, lhe renderam uma sobrevida ainda inédita naqueles tempo. A história é importante por quem Ron Woodroof é.

Ron Woodrof é um cowboy machista, misógino e homofóbico, para dizer o mínimo. Ele, justamente ele, entre tantos, pega a doença gay, como a aids era conhecida até então. E aí o opressor se torna oprimido. E rapidamente vê que as únicas pessoas que o aceitam – ou, em um primeiro momento, a reserva de mercado que ele precisa para fazer dinheiro – são exatamente aquelas que ele mais desprezava. Seu parceiro de negócios, o travesti Rayon, o papel de Leto, então, é a encarnação de tudo o que ele mais detesta. Se convertendo rapidamente na sua porta de salvação.

McConaughey tem um mérito duplo nesse papel. Um deles por acidente. A entrega com que viveuWoodroof é o último tijolo na construção de sua carreira como ator respeitado, coisa que vem fazendo nos últimos anos com dedicação. E seu emagrecimento doentio é apenas um dos artifícios. Mas, ao mesmo tempo, ele ainda é o mesmo ator das comédias românticas e de ação. O cara que era pago mais por como fotografava bem sem camisa do que pela sua habilidade e talento na atuação.

É difícil tirar essa imagem de nossa mente. Em um nível profundo e inconsciente, ele ainda é o ideal do macho americano. O mesmo material de que Woodroof é feito. Mais do que o sotaque sulista e a magreza, é essa aura que confere credibilidade para o personagem. Com isso, o mérito maior de McConaughey é o de conseguir mostrá-lo se amaciando, sem jamais mudar seus modos brutos.

Não há redenção catártica. Mas há compreensão. E no carinho sincero, ainda que bruto, que Woodroof desenvolve por Rayon é que está a verdadeira força de “Clube de Compras Dallas”.

Publicado originalmente no Portal POP.

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Luiz Gustavo Vilela

Luiz Gustavo Vilela é jornalista formado pela PUC-Minas, especialista em Comunicação e Cultura pela UTFPR, mestre e doutorando em Comunicação e Linguagens pela UTP. Entre 2011 e 2015 foi crítico de cinema no Portal POP.

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